Poético-Ecologia - Manuel Antônio de Castro
Poética, energia e ecologia
Poética vem do grego Póiesis. Esta palavra diz simplesmente o agir e sua energia, pela qual tudo se cria, se produz, se faz, se manifesta, acontece. É uma energia tão primordial e misteriosa que nos percorre e está na origem de todas as manifestações da realidade. É uma energia que vai do espiritual ao vital, do psíquico ao corporal e ao ontológico. É a energia poética, é a essência de todo o nosso agir e também o sentido de tudo o que fazemos e até do que não fazemos. Pela sua força realizamos a travessia de nossas vidas.
A póiesis é a essência da ecologia. A relação entre póiesis e ecologia é bem evidente, pois ela também é formada do grego. Eco provém da palavra grega oikia, casa. Mas o que é uma casa? Se queremos ir além da denominação de um lugar de habitação, podemos nos lembrar de um pensamento de Heidegger muito citado, muitas vezes quase como um clichê. E a pior coisa que pode acontecer a uma palavra de pensamento é tornar-se clichê. Diz ele: “A linguagem é a casa do ser.” Nesse entendimento, a linguagem não é apenas a fala ou a escrita. Assim como a casa não é apenas algo material que serve da abrigo. É muito mais. É o aconchego da família, o nosso lugar de referência, aquele de onde sempre saímos e para onde sempre voltamos. A casa recolhe em si todo o sentido de nossa vida e de nossas ações. Ela é como o útero materno, nossa origem e fonte de realização. Nela se concentra toda nossa energia e dela haurimos nosso vigor de resistência à morte. É nesse sentido que a linguagem é casa e a casa é linguagem. E ser é isso, essa manifestação e presentificação do que nos foi presenteado e manifestado a partir da linguagem e da energia poética.
E o que tem a ecologia a ver com linguagem e casa? A segunda palavra que compõe eco-logia é –logia. Seu sentido mais comum é conhecimento e estudo. Mas é um significado derivado. Seu sentido essencial provém da própria palavra grega: logos. Esta é uma palavra tão rica e misteriosa que foi traduzida de muitas maneiras, sem que se possa apreender seu sentido radical. Sem dúvida nenhuma, a tradução que mais se aproxima é linguagem, mas no sentido que demos a casa. Porém, a casa também diz o mundo em que somos jogados e em que necessariamente temos que viver.
A ligação agora entre mundo e póiesis é muito evidente, pois está indicando o sentido de nosso agir, nosso agir se dá no mundo e manifesta mundo. Porém, não há mundo sem Terra. Agora podemos entender porque a ecologia é esse movimento que cuida da Terra e a quer preservar. Em última instância, um tal cuidado cuida da Terra como a casa de todos nós, pois dela nos advém o sentido do ser: o sermos filhos da Terra na vida e o voltarmos a ela na morte. A Terra como mundo se torna em verdade a memória de cada um e de nossos antepassados, ou seja, nossa casa e linguagem. Preservar e deixar a Terra ser Terra é o apelo que ressoa em nós na Poético-ecologia, onde a ecologia se torna poética porque esta como essência do agir deixa eclodir a Terra em seu sentido de casa e linguagem, de vida e morte.
Heidegger é um pensador. A sua frase tão conhecida é seguida de uma outra bem menos citada, mas que complementa o sentido da primeira. Diz: “Os poetas e pensadores lhe servem de vigia”. Que vigília é esta? Ela é a escuta amoroso-desvelante da Terra como mundo. Mas quem são os “poetas”, quem são os “pensadores”? Tendemos a confundir poetas com retóricos de “formas” poéticas e pensadores com “filósofos” que falam em geral num discurso abstrato e racional de difícil compreensão. No primeiro caso, fica-se à mercê dos jogos retóricos das palavras e no segundo a um jogo racional e conceitual, que torna a realidade inacessível em sua simplicidade. Num tal jogo o apelo da fala da linguagem não acontece. Ele só acontece nas obras dos poetas e pensadores.
Chefe Seattle: o poeta-pensador
Todos sabemos que o espírito sopra onde quer e habita os que na simplicidade escutam auscultando a sua fala. A simplicidade da poesia pensante acontece de muitos modos e em diferentes épocas. Não há causas explicativas, nem cânones, nem modelos. E seu vigor, sua póiesis é tão vigorosa que faz eclodir a realidade em sua riqueza sempre nova. É o que aconteceu numa fala famosa de escuta da linguagem, proferida por um índio poeta-pensador, o Chefe Seattle. Em sua fala, póiesis, linguagem, pensamento e ecologia estão tão profundamente unidas e são tão vigorosas que não pararam de provocar escutas, convocar atitudes poético-ecológicas. É a poético-ecologia na mais alta densidade.
Fala do Chefe Seattle
No ano de 1854, o presidente dos Estados Unidos Franklin Pierce fez a uma tribo indígena a proposta de compra de grande parte de suas terras, oferecendo em contrapartida a concessão de uma outra “reserva”. Abaixo a resposta do pensador e poeta Chefe Seattle. Ela nos lembra imediatamente o Cântico das criaturas de São Francisco de Assis, este poeta-místico inaugural. Só o mistério pode fazer entender duas falas tão irmãs em tempos e lugares e em povos tão distintos. Na realidade, uma profunda experienciação de fraternidade universal e de amor à Mãe-Terra.
Escutemos sua fala. Após cada parágrafo, proponho algumas reflexões.
§1 - Como é que se pode comprar ou vender o céu, o calor da terra? Essa idéia nos parece estranha. Se não possuímos o frescor do ar e o brilho da água, como é possível comprá-los? Cada pedaço desta terra é sagrado para meu povo. Cada ramo brilhante de um pinheiro, cada punhado de areia das praias, a penumbra na floresta densa, cada clareira e inseto a zumbir são sagrados na memória e experiência de meu povo. A seiva que percorre o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho.
Para dialogar com a fala poético-pensante do Chefe Seattle neste primeiro parágrafo centralizamo-nos em algumas palavras, matrizes de questões. Sem dúvida, a questão fundamental é o sagrado. O que é o sagrado? Nós não sabemos, mas sabemos que ele atua, é póiesis, pois dele tudo provém e se faz presente
Ela é corpo-vivo. O que é um corpo? Uma idéia comum dicotomiza corpo e espírito, aquele é material e este é imaterial. Esta dicotomia em nada ajuda a nos abrirmos para o pensamento poético da linguagem como manifestação do sagrado. Este a tudo perpassa e vivifica, do “inseto que zumbe à penumbra da floresta ... pois a seiva que percorre o corpo das árvores carrega consigo as lembranças do homem vermelho”.
O sagrado ao se fazer linguagem-corpo vigora na Memória e experiência de cada povo, quando a póiesis, como energia essencial, faz emergir o Corpo-Terra em sua vitalidade e excessividade poética. A póiesis se faz sentido como sentido de um povo na sua experienciação da Terra-corpo como Memória: é o sagrado.
§2 - Os mortos do homem branco esquecem sua terra de origem quando vão caminhar entre as estrelas. Nossos mortos jamais esquecem esta bela terra, pois ela é a mãe do homem vermelho. Somos parte da terra e ela faz parte de nós. As flores perfumadas são nossas irmãs; o cervo, o cavalo, a grande água, são nossos irmãos. Os picos rochosos, os sulcos úmidos nas campinas, o calor do corpo do potro e o homem – todos pertencem à mesma família. Portanto, quando o Grande Chefe em Washington manda dizer que deseja comprar nossa terra, pede muito de nós.
Se antes o sagrado a tudo reúne e funda, agora aparece a Terra como a Mãe-Terra que a tudo origina. E somos, portanto, todos seus filhos e somos irmãos e uma grande e única família. Se antes temos o povo como questão de pertencimento e fraternidade, agora temos a família de todos os seres que constituem a Mãe-Terra: Flores, picos rochosos, campinas, água, potro, ser-humano, todos pertencentes à mesma família. A Terra se mostra como um Corpo-vivo que a todos origina e abriga fraternalmente. É a fraternidade que São Francisco já poietizara e cantara no “Cântico das criaturas”.
Porém, o poema do Chefe Seattle inicia e termina com um lamento, originado na dicotomia entre Céu e Terra. Criando essa separação, o Ocidente não se dá conta de que opera um esquecimento, o de que temos origem na Mãe-Terra e voltamos ao seu seio. A morte – o que é a morte? - se torna um momento de plenitude e reintegração no originário. “Somos parte da Terra e ela faz parte de nós”. Só numa separação entre ser-humano e Terra surge a distinção matéria e espírito. O que é a matéria para que saibamos o que é o espírito? O que é o espírito para que saibamos o que é a matéria? Só nessa visão há começo e término. Quando na realidade há princípio e plenitude. A fraternidade e morte poética, fundadas na póiesis, fazem da Mãe-Terra a nossa Casa. Não podemos ser seres errantes entre as estrelas, desterrados da Terra, à procura de uma Casa que lá não se encontra.
E surge então a perplexidade poética: Sendo uma grande família pertencente à Memória imemorial da Mãe-Terra como alguém propõe que a Mãe-Terra seja vendida? Quem pede isso “pede muito a nós”.
§3 - O Grande Chefe diz que nos reservará um lugar onde possamos viver satisfeitos. Ele será nosso pai e nós seremos seus filhos. Portanto, nós vamos considerar sua oferta de comprar nossa terra. Mas isso não será fácil. Esta terra é sagrada para nós. Essa água brilhante que escorre nos riachos e rios não é apenas água, mas o sangue de nossos antepassados. Se lhes vendermos a terra, vocês devem lembrar-se de que ela é sagrada e que cada reflexo nas águas límpidas dos lagos fala de acontecimentos e lembranças da vida do meu povo. O murmúrio das águas é a voz de meus ancestrais.
Hoje a globalização nos promete um “lugar onde possamos viver satisfeitos”. Será que há um outro “lugar”, fora do seio de nossa origem? Não podemos confundir lugar com espaço, o espaço terrestre e até sideral. Lugar é a Casa-Linguagem, o mundo originário, o sentido de toda póiesis. Por isso só nela encontramos a paz e a integração, o prazer e a satisfação.
A água que percorre o rio e desce das montanhas e cai do Céu e cobre a Terra viaja nas veias de todos os irmãos vivos não é o H2O. É “o sangue de nossos antepassados”. A venda e a compra, a transformação funcional de tudo em recursos – naturais ou humanos – provoca uma amnésia mortal: o esquecimento do poético, o esquecimento do sagrado.
§4 - Os rios são irmãos, saciam nossa sede. Os rios carregam nossas canoas e alimentam nossas crianças. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem lembrar e ensinar a seus filhos que os rios são irmãos nossos e seus também. E, portanto, vocês devem dar aos rios a bondade que dedicariam a qualquer irmão.
Os rios são misteriosos. A superfície rumorosa e fluente se funda na calma silenciosa e abismal das suas profundidades. Como veias vitais alimentam o Corpo-Terra para que esta produza frutos e nos alimente. Isto deveríamos ensinar a nossos filhos. Na funcionalidade, pelo contrário, os rios se tornaram vias de transporte dos produtos. Isso é bom, mas não deve impedir que os preservemos e tratemos com a bondade com que trataríamos a um irmão. Seu mistério é o sagrado.
§5 - Sabemos que o homem branco não compreende os nossos costumes. Uma porção de terra, para ele, tem o mesmo significado que qualquer outra, pois é um forasteiro que vem à noite e extrai da terra aquilo de que necessita. A terra não é sua irmã, mas sua inimiga, e quando ele a conquista, prossegue seu caminho. Deixa para trás os túmulos de seus antepassados e não se incomoda. Rapta da terra aquilo que seria de seus filhos e não se importa. A sepultura de seu pai e os direitos de seus filhos são esquecidos. Tratam sua mãe, a Terra, e seu irmão, o Céu, como coisas que podem ser compradas, saqueadas, vendidas como carneiros ou enfeites coloridos. Seu apetite devora a terra, deixando somente um deserto.
A Mãe-Terra perdeu o seu sentido e a globalização técnico-científica trata a Mãe-Terra com indiferença e o ser-humano vai-se tornando um estranho e forasteiro e alienado e despatriado dentro da própria Casa. Diuturna e noturnamente extrai bens para satisfazer a necessidade que essencialmente cada ser-humano não tem e de que não precisa para ser. Impulsionado por uma competição sem tréguas, a Mãe-Terra tornou-se sua inimiga e o ser-humano prossegue numa devastação que acabará por devastar a si-mesmo, esperando-o um deserto de insatisfação mortal. E a Memória dos antepassados se esvai no roldão da desertificação. A tudo transforma em coisas e objetos. A Casa-Linguagem perde sua voz e colorido e aconchego de seio materno para se tornar um deserto do sem-sentido, reduzida a uma soma de coisas e objetos descartáveis.
§6 - Eu não sei, nossos costumes são diferentes dos seus. A visão de suas cidades fere os olhos do homem vermelho. Talvez seja porque o homem vermelho é um selvagem e não compreenda. Não há um lugar quieto na cidade do homem branco. Nenhum lugar onde se possa ouvir o desabrochar de folhas na primavera ou o bater das asas de um inseto. Mas talvez seja porque eu sou um selvagem e não compreenda. O ruído parece somente insultar os ouvidos. E o que resta da vida se um homem não pode ouvir o choro solitário de uma ave ou o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, à noite? Eu sou um homem vermelho e não compreendo. O índio prefere o suave murmúrio do vento encrespando a face do lago, e o próprio vento, limpo por uma chuva diurna ou perfumado pelos pinheiros.
O saber de sabor e sabedoria, aparentemente selvagem, não compreende tanto conhecimento mutável e descartável, ruído e agitação. Para quê? Para chegar aonde? Na agitação que dá lugar ao agir da póiesis não há mais lugar para a quietude onde auscultando se ouça o suave “desabrochar de folhas na primavera ou o bater de asas de um inseto”. Porque tudo isso é inútil, no império da utilidade. Não será tudo isto porque a ação do pensamento e o pensamento da ação da póiesis não produz esse real de objetos e instrumentos? Por que a exclusão e exclusividade do real funcional? Mas o que resta de vida e póiesis e pensamento se um ser-humano não se acha nem acha a sua Casa onde possa “ouvir o choro solitário de uma ave ou o debate dos sapos ao redor de uma lagoa, à noite”? Onde o silêncio poético em meio ao falatório das ondas sonoras dos canais de televisão, rádio e celulares?
§7 - O ar é precioso para o homem vermelho, pois todas as coisas compartilham o mesmo sopro: o animal, a árvores, o homem, todos compartilhamos o mesmo sopro. Parece que o homem branco não sente o ar que respira. Como um homem agonizante há vários dias, é insensível ao mau cheiro. Mas se vendermos nossa terra ao homem branco, ele deve lembrar-se de que o ar é precioso para nós, que o ar compartilha seu espírito com toda a vida que mantém. O vento que deu a nossos avós seu primeiro inspirar também recebe seu último suspiro. Se lhes vendermos nossa terra, vocês devem mantê-la intacta e sagrada, como um lugar onde até mesmo o homem branco possa ir saborear o vento açucarado pelas flores dos prados.
O espírito sopra onde quer, porque sua póiesis a tudo penetra e vivifica. Ao sopro vital os gregos deram o nome de psique, ou seja, o inspirar e o expirar, o viver na liberdade do livre aberto. Impulsionados pela inspiração poética do Sopro Inaugural temos o dever de preservar a Mãe-Terrra “intacta e sagrada como um lugar” onde todos os seres-humanos possam “saborear o vento açucarado pelas flores dos prados”.
§8 - Portanto, vamos meditar sobre sua oferta de compra de nossa terra. Se decidirmos aceitar, imporei uma condição: o homem branco deve tratar os animais desta terra como seus irmãos. Sou um selvagem e não compreendo qualquer outra forma de agir. Vi milhares de búfalos apodrecendo na planície, abandonados pelo homem branco que os alvejou de um trem ao passar. Eu sou um selvagem e não compreendo como é que o fumegante cavalo de ferro pode ser mais importante que o búfalo, que sacrificamos somente para permanecer vivos. O que é o homem sem os animais? Se todos os animais se fossem, o homem morreria de uma grande solidão de espírito. Pois o que ocorre com os animais, breve acontecerá com o homem. Há uma ligação em tudo.
O agir da globalização na sua ânsia de a tudo instrumentalizar e funcionalizar não conhece outro agir e faz questão de não conhecer nem se propor a compreender. Não é esse o verdadeiro selvagem? Nem se dá conta de que raciocinar não é o mesmo que pensar. Mas será que só existe esse agir produtivo, classificatório, sistemático e funcional? O que isso faz com o nosso corpo? Será que não existe outro agir ao lado desse que preserve a vida e só se aproprie dos seres vivos para permanecerem vivos, em sua autopoiese? Será que não existe um outro agir que preserve a Mãe-Terra e não faça da morte uma função lucrativa, empesteando o ar com o mau-cheiro dos lucros abusivos e imorais? O último preço será a própria vida? E então o que restará senão uma temível e terrível solidão do espírito, a solidão da morte em vida?
§9 - Vocês devem ensinar às suas crianças que o solo a seus pés é a cinza de nossos avós. Para que respeitem a terra, digam a seus filhos que ela foi enriquecida com as vidas de nosso povo. Ensinem às suas crianças o que ensinamos às nossas, que a Terra é nossa mãe. Tudo o que acontecer à Terra acontecerá aos filhos da Terra. Se os homens cospem no solo, estão cuspindo em si mesmos. Isto sabemos: a Terra não pertence ao homem; o homem pertence à Terra. Isto sabemos: todas as coisas estão ligadas como sangue que une uma família. Há uma ligação
O que ensinar no sistema educacional? O que aprender? Por acaso somos solicitados e exigidos só no aprendizado – inevitável e necessário – ou também na aprendizagem de que o solo a nossos pés é cinza de nossos avós e de todos os nossos antepassados? Aprendemos que o ser-humano pertence à Terra, que há uma ligação em tudo e com todos os tempos e lugares, que há uma memória pessoal, coletiva, do Ser que a tudo reúne? Por acaso nos ensinam que há um saber inaugural que a todos une e “o ser-humano não tramou o tecido da vida: ele é simplesmente UM DE SEUS FIOS”?
§10 - Mesmo o homem branco, cujo Deus caminha e fala com ele de amigo para amigo, não pode estar isento do destino comum. É possível que sejamos irmãos, apesar de tudo. Veremos. De uma coisa estamos certos e o homem branco poderá vir a descobrir um dia: nosso Deus é o mesmo Deus. Vocês podem pensar que O possuem, como desejam possuir nossa terra; mas não é possível. Ele é um Deus do homem, e Sua compaixão é igual para o homem vermelho e para o homem branco. A terra lhe é preciosa e feri-la é desprezar seu Criador. Os brancos também passarão; talvez mais cedo que as outras tribos. Contaminem suas camas e uma noite serão sufocados pelos próprios dejetos.
Para além de um fundamento causal com o nome de Deus ou com o nome de razão, há inexoravelmente um “destino comum” a todos os povos e religiões. “Nosso Deus é o mesmo Deus.” Assim como o conhecimento científico e sistemático pretende e pensa possuir a Terra também pensa e pretende ser o possuidor do seu Deus. “Mas não é possível”. Há um só para todos. É o sagrado que se presentifica e retrai misteriosamente em todas as suas manifestações religiosas e poéticas. Não há uma divindade abstrata proposta pelo conhecimento essencialista da metafísica, onde Deus se torna posse da razão. O sagrado em seu mistério não pode ser um conceito abstrato na medida em que é a compaixão vivificante de todos os seres-humanos. Ferir e desertificar a Mãe-Terra é desprezar o seu vigor criativo: o sagrado poético.
§11 - Mas quando de sua desaparição, vocês brilharão intensamente, iluminados pela força do Deus que os trouxe e esta Terra e, por alguma razão especial, lhes deu o domínio sobre a Terra e sobre o homem vermelho. Esse destino é um mistério para nós, pois não compreendemos que todos os búfalos sejam abatidos exterminados, os cavalos bravios sejam todos domados, os recantos secretos da floresta densa impregnados do cheiro de muitos homens e a visão dos morros obstruída por fios que falam. Onde está o arvoredo? Desapareceu. Onde está a águia? Desapareceu. É o final da vida e o início da sobrevivência.
O domínio hoje planetário da técnica confronta o ser-humano para além de todas as fronteiras e margens com a questão real de sua sobrevivência. É um destino misterioso que jamais poderá ser explicado, porque não é fundado
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