10 agosto 2006

O gênero e os conceitos

O gênero e o conceito

Prof. Manuel Antônio de Castro

www.travessiapoetica.com

No início era a physis. O questionar advém da physis como mito e como pensamento no admirar-se (taumadzein, em grego). O admirar-se admira-se da riqueza excessiva do real em sua manifestação e então o ser-humano, ser das questões, se pergunta pela totalidade o real enquanto ta onta (os entes). To on (o ente) centraliza todo pensamento desde então. E surgiram os três diferentes conceitos de To on. A primeira percorre todas as demais, na medida em que ela pro-voca o próprio questionar enquanto ele se formula num dis-curso. Discurso se diz em grego: logos. Mas também significa palavra e linguagem. O estudo do discurso se faz através de quatro disciplinas hoje largamente estudas, que se tornam, no fundo, a base das demais disciplinas: a lógica, a gramática, a dialética e a retórica. Mas para se fundarem como disciplinas reduzem o logos à pro-posição. É que há uma homologia entre a primeira interpretação da “coisa” (to on) e a estrutura da pro-posição. Porém, Heidegger diz:

“A coisa é, como qualquer um acredita saber, aquilo em torno do qual as propriedades se reuniram. Fala-se então do cerne das coisas. Os gregos devem ter nomeado isto to hypokeimenon. Este caráter de cerne da coisa era para eles, de certo, o que servia de fundamento e o já sempre existente. Porém, as características se denominam ta symbebekota, aquilo que também sempre já foi posto com cada existente e em virtude disso com ele aparece”. §18.

“É a estrutura da enunciação simples (a ligação de sujeito e predicado) a imagem reflexa da estrutura da coisa (da união da substância com os acidentes)? Ou é assim apresentada a estrutura da coisa e projetada de acordo com a montagem da proposição?” §20

“A questão, o que seria primeiro e o determinante se é a estrutura da proposição ou se é a estrutura da coisa não decidido até o momento. É até duvidoso se esta questão, colocada desta forma geral, seja passível de dicisão”.§21

Ao cerne da coisa enquanto suporte de características chama Aristóteles ousia, particípio presente feminino do verbo einai. A tradução corrente é propriedade, mas foi traduzida para o latim como substância, isto é, substância. As características das coisas, enunciadas como predicativos ou acidentes ou qualidades, são propriamente as propriedades da coisa, da sua substância, ou como também foi traduzida de outra forma a ousia, a sua essência. Conhecer uma coisa é apreendê-la em suas propriedades, pois estas manifestam a essência da coisa, isto é, to on. A essência constitui a identidade da coisa pois ela é o suporte daquilo que lhe é próprio. Buscar a identidade de algo é buscar a sua essência enquanto ela é o que lhe é próprio, o suporte, o fundamento, a causa das suas propriedades.

Ocorre que pela primeira interpretação da coisa há uma homologia entre a “coisa” nessa interpretação e a proposição, de tal maneira que à estrutura da proposição corresponde a estrutura da coisa, a sua essência, ou seja, a sua identidade. Se a ousia é o fundamento da “coisa”, do “on” (sendo do ser), a proposição é o fundamento lógico. É que o lógico é o fundamento da “coisa” enquanto verdade lógica. E o que é verdadeiro é real. Daqui a reduzir o “on” ao lógico foi um passo muito rápido e lógico. E a verdade fica reduzida à proposição lógica. A pro-cura da essência da identidade fica reduzida ao enunciado das proposições. E todo o real fica reduzido ao lógico proposicional, algo real mas abstrato, sem a concretude e frescor da excessividade do real. Então os passos foram os seguintes:

Physis > Ser> on> ousia> substância> essência> propriedades> identidade> proposição lógica> conceito abstrato. O que era questão tornou-se conceituação lógico-abstrata, onde se fala de essência abstrata, racional e identidades lógico-racionais. Neste processo se gerou o chamado essencialismo, que parte de uma questão real e concreta, mas se resolve em conceitos abstratos. As identidades conceituais são abstratas, já a identidade como questão é sempre concreta. Vejamos um outro esquema onde a complexidade da causalidade e da identidade se faz presente.

Não podemos esquecer que a “coisa” é a questão. Pela primeira interpretação vamos ter, por exemplo, a “coisa”: casa.

A Casa é alta, velha, ampla, colonial etc. Os predicativos manifestam/dizem as qualidades da casa, sua identidade, sua essência, ou seja, suas propriedades. Porém, esta casa é um “isto é” e não qualquer casa, ou seja, a idéia geral de casa, que só existe enquanto idéia, conceito lógico. A “coisa” real é o que “isto é” enquanto “esta” casa. Já podemos notar que o conceito “cria” uma realidade abstrata que não dá conta da “coisa”, porque o conceito de “casa” pode-se aplicar a muitos “istos”, ou seja, a diferentes casas, onde o que é próprio de cada “isto”, a sua identidade se perde. Por outro lado, a vantagem do conceito é que se pode aplicar universalmente, ou seja, em geral e permite assim ... Contudo, tudo isto é muito complexo, por isso vejamos outros exemplos.

Comparemos:

1º. João é alto, moreno, forte, inteligente, rico, ético, estudioso etc. etc. As qualidades de João me dão a sua essência, a identidade, ou seja, elas me dizem o que é próprio de João. João é um “isto” concreto, lógico e real.

2º. João é homem. Maria é mulher

José é homem. Marta é mulher

Luís é homem. Joana é mulher.

Nestes exemplos, a identidade, ou seja, o que diz a propriedade de cada um está no predicativo, que diz a essência, a identidade de cada um. O gênenro homem para os primeiros e o gênero mulher para os terceiros. São predicativos essenciais porque dizem a identidade tanto para os homens como para as mulheres. Só que agora a essência está no predicativo, que se faz presente em cada sujeito. Tendo em vista esta mutabilidade concreta da proposição e sua constituição, vamos ter como princípio fundamental da identidade: A é A. Esse é não pode dizer igualdade. O que ocorreu? De novo temos aí uma identidade abstrata. Senão vejamos: João não é o mesmo homem que José, que não é o mesmo homem que Luís, que não é o mesmo homem que ...O que ocorreu aqui? O gênero indica uma identidade abstrata e que não dá conta da “coisa” (do real=res=coisa), pois não dá conta das diferenças. Por outro lado, o ponto de convergência e verdadeira essência, se ainda de essência se pode falar, é o mesmo. Por isso, a questão da identidade e da essência remonta a Parmênides que disse:

To gar autò noein estín te kai einai.

O mesmo, pois, tanto é apreender(pensar) como também ser.

Podemos notar que vai haver sempre uma relação problemática entre sujeito e predicado, pois os predicativos tanto podem indicar as qualidades do sujeito como podem pode o predicado determinar a essência do sujeito. O outro exemplo que cai no mesmo problema diz respeito às diferenças culturais.

João é brasileiro. Maria é portuguesa.

José é português. Marta é brasileira.

Aqui a identidade cultural vai além dos gêneros. Mas podemos notar que essa identidade cultural também não dá conta do “isto é” de cada uma das pessoas citadas. O certo é que a identidade cultural como a de gênero diz uma certa propriedade, mas que não dá conta da identidade como um todo, ou seja, aquilo que faz com que cada um seja o que é. Fica logo evidente que se trata aí de identidades conceituais abstratas, nunca de identidades concretas, pois estas vigem sempre no âmbito das questões.

Quando as palavras perdem sua concreticidade manifestativa para os conceitos resultantes das proposições, é necessário que as palavras retornem ao círculo poético de manifestação da coisa como coisa. É o que permanentemente nos convida a fazer Caeiro.

Graças a Deus que as pedras são pedras,

E que os rios não são senão rios,

E que as flores são apenas flores.

(Caeiro, XXVIII)

Como vemos o que nos convida o poeta é a deixar as “coisas” serem “coisas” sem os conceitos. Temos aí o princípio da identidade em todo o seu enigma de deixar as “coisas” serem “coisas”.

E ainda:

(Louvado seja Deus que não sou bom,

E tenho o egoísmo natural das flores

E dos rios que seguem o seu caminho

Preocupados sem o saber

Só com florir e ir correndo.

(Caeiro, XXXII)

Será que a questão de fundamento, essência, causa, identidade não consiste em simplesmente ser?

A minha alma é simples e não pensa.

(Caeiro, XXX)

A simplicidade de maneira alguma anula as diferenças, mas estas como tensão de identidade radicam no mesmo:

Mas sou sempre eu, assente sobre os mesmos pés –

O mesmo sempre, graças ao céu e à terra

E aos meus olhos e ouvidos atentos

E à minha clara simplicidade de alma...

(Caeiro, XXIX)

Deve-se compreender que o trabalho dos conceitos abstratos não são irrealidades, mas modos de assediarmos as coisas, que amam se ocultar, como diz imemorialmente já Heráclito e nos repete poeticamente Caeiro. As coisas se nos presenteiam de muitas maneiras, como muito bem já disse Aristóteles. E certamente uma das mais plenas é a arte. Mas então é preciso compreender a arte como obra da verdade.

A seguir apresento um texto tirado de minhas anotações de lógica. Aqui tudo é conceito, mas que dá pistas dos descaminhos em que a “coisa” se perde, isto é, to on, isto é, nosso ser. Como são conceitos que perpassam diferentes teorias da arte e de outras disciplinas trarão para quem tiver paciência de o ler algum proveito, pois esses conceitos esclarecem muito palavreado inútil da teoria literária.

Fica ainda um esclarecimento. Para a lógica, o gênero dos gêneros é o ser, ou seja, o conceito dos conceitos, algo puramente lógico a que não corresponde mais nenhuma “realidade”, nem se encontra andando no corredor, como ocorre, por exemplo, com o “eu lírico”. Não deixa de ser melancólico que a veneranda physis tenha sido reduzida a esse ser fantasmagórico, hoje travestido de representações e realidade virtual. E diante do simulacro de realidade e da parafernália de conceitos poderíamos repetir com o poeta:

Conceitos, conceitos, conceitos.

A lógica e a identidade

A lógica distingue:

atuais

Ente reais

potenciais

São entes que possuem alguma realidade, seja atual, seja pontencialmente: caderno, Maria, semente de couve.

/ sem base na realidade: sereia etc.

Entes de razão

/ com base na realidade, sendo:

1º. De negação: ausência de qualquer ente: o nada, vácuo etc.

2º. De privação: ausência de ente que devia existir: cegueira, trevas etc.

3º. De relação: que se refere a um ente existente: homem, mesa etc.

É através dos entes de razão de relação que posso pensar sobre a realidade. Não são a realidade, mas a representam. Temos, por isso:

a – alguém que conhece;

b – objeto conhecido;

c – conceito (idéia).

O conceito vai ter algumas características que o “objeto” não tem:

a – todo conceito é universal;

b – todo conceito é abstrato.

/ pensamento

Por isso o conceito vai ter dois aspectos:

/ palavra

Os conceitos reproduzem apenas o aspecto formal, de tal modo que podem até ser substituídos por símbolos matemáticos. O conceito é o conhecimento intelectual de uma “coisa”. Conhecer intelectualmente é saber o que as “coisas” são em si mesmas, é apanhar a sua “essência” ou “natureza”. E tudo que é, de algum modo, tem sua “essência”: a cor, o vermelho, o mar, a volição, a raiva, o animal etc. O conhecimento intelectual nos permite distinguir umas “coisas” das outras, isto é, saber que isto é isto e não aquilo, que amor é amor e não ódio. Através da inteligibilidade apreendemos o que cada “coisa” é, ou seja, sua “essência” ou, como diziam os escolásticos, sua “qüididade” (quid est).

O conceito é abstrato porque nos apresenta a “essência” (qüididade) de uma coisa sem considerar as notas, as carcterísiticas, os traços individuais de cada “coisa”. Abstrato vem do latim e é formada da prefixo abs- que significa: de, de junto de, e de traho que significa: tirar, arrastar. Então, abstrair é tirar de junto de. Exemplos: Quando digo: “Joana é mulher”, mulher é conceito abstrato, pois ao dizer o que Joana é, considero-a apenas abstratamente, sem levar em conta a singularidade de Joana, uma vez que Joana não é exatamente igual a qualquer mulher. Quando digo: “Isto é uma mesa”, não considero a forma nem o tipo de material de que é feita etc.

Como no conceito consideramos apenas a “essência” (qüididade), deixando de lado as notas individuantes, o conceito adquire uma terceira qualidade: a fixidez. Todo conceito é fixo, constante, rigorosamente determinado. Graças a esta fixidez podemos falar e discutir sobre o “mesmo” abstratamente. Questão: Por que surgem as discussões, as opiniões contrárias?

Para o raciocínio, esta qualidade é de suma importância. Questão: Conceitos, portanto, não mudam, não têm história? Homem sempre foi homem? Mulher sempre foi mulher? Sol sempre foi sol?

O conceito é também universal. Graças à abstração que nos deixa só com a “essência” de uma coisa e graças à fixidez, que nos conserva o significado, vejo imediatamente que posso atribuir essa “essência” a um número indefinido de “objetos” ou “coisas” ou “sujeitos”, e, naturalmente, com o mesmo significado. Por exemplo: “Homem” vale para Pedro, Manuel, João etc. “Animal” vale para todos os seres sensitivos. “Essência” vale para todos as “coisas” que existem em si. Esta “qualidade” da universalidade representa para nosso conhecimento uma grande vantagem, pois, a partir daquilo que é comum a muitos, posso generalizar e sintetizar, posso comparar, estabelecer leis e normas gerais. Questão: Essas “leis” e “normas” funcionam, mas dão conta realmente de toda a realidade a que se aplicam? O que se perde nessas “leis”? Onde ficam as diferenças? Que “essência” é essa que não dá conta das diferenças? E as diferenças também não são essenciais?

Uma ulterior qualidade lógica de todo conceito é que tem sua compreensão e sua extensão. Tomemos o conceito “homem”. Podemos discernir neste conceito um certo número de elementos e de aspectos inteligíveis, que reunidos, o distinguem de qualquer outro. Portanto, são elementos ou aspectos essenciais. No caso do homem são: substância, corpo, vivo, sensitivo, racional. No conceito “animal” temos como elementos essenciais: substância, corpo, vivo, sensitivo. Em linguagem filosófica, tais elementos ou aspectos têm o nome de “notas”. A compreensão de um conceito é o conjunto de notas que compreende. A extensão de um conceito é, portanto, o conjunto de sujeitos aos quais pode convir. O conceito “carioca” estende-se a todos os indivíduos que nasceram no Rio de Janeiro, não importa o bairro, a idade, o sexo etc.

Como facilmente se verifica com qualquer conceito, a relação entre a compreensão e a extensão dos conceitos é que ambas estão entre si em relação inversa, ou seja, quanto maior for a compreensão tanto menor será a extensão. E quanto maior for a extensão, tanto menos será a compreensão. Numa palavra: tirando do conceito uma nota essencial, logo vai aumentar a extensão do conceito (novo).

COMPREENSÃO: HOMEM

substância, corpórea, viva, sensitiva, racional = homens

substância, corpórea, viva, sensitiva = homens e animais

substância, corpórea, viva = homens, animais e plantas

substância, corpórea = homens, animais, plantas e minerais

substância = homens, animais, plantas, minerais e espíritos

Notemos mais uma vez que todas as qualidades enumeradas são qualidades lógicas, que como tais apenas existem na mente. Nenhuma destas qualidades existe na realidade extra-mental. Não há uma pedra inteligível nem um cachorro abstrato.

Um conceito com maior extensão leva, na lógica, o nome de “conceito superior” e os conceitos que, no caso, entram em sua extensão são chamados “conceitos” inferiores”. Por exemplo: O conceito “animal” é extensivo aos conceitos: homens e “brutos” (!!!). “Sul-americano” é conceito superior em relação a “brasileiro” etc.

Organizando um grupo de conceitos segundo sua extensão, notamos logo que um conceito vai ter maior extensão e outro menor, e assim será conceito inferior com respeito àquele, mas, por sua vez, pode ter debaixo de si outros conceitos e sob este aspecto será conceito superior. Por exemplo: O conceito “sul-americano” tem como inferiores: brasileiros, chilenos etc., paulistas, cariocas etc. O conceito “brasileiro”, porém, é conceito superior em relação a “paulistas, gaúchos, cariocas” etc.

Os conceitos podem ser organizados em classes.

Exemplo de classificação:

Orientais e ocidentais

Europeus e americanos

Norte-americanos e sul-americanos

Chilenos, brasileiros, peruanos etc.

O motivo pelo qual organizamos entre si vários conceitos está no fato de que estes conceitos têm algo em comum e, ao mesmo tempo, algo que os diferencia. Por exemplo: Na classificação de metais em precisoso e não-preciosos , de bebidas em alcoólicas e não-alcoólicas. Olhando bem, verificamos que numa boa classificação de conceitos, acrescentamos cada vez ao elemento comum uma nota que os faz diferenciar. Ora, se também a nota é um elemento “essencial” e o conjunto de notas nos oferece a compreensão do conceito, teremos a chamada classificação essencial. Exemplo:

Substância

Corpórea e não-corpórea

Viva e não-viva

Sensitiva e não-sensitiva

Racional e não-racional

A classificação será acidental se fornecer apenas diferenças acidentais como é a classificação do conceito “homem” em branco e preto etc. Para organizar uma determinada classificação parte-se de um critério. Por exemplo, podemos classificar os funcionários de acordo com as funções, os carros segundo os modelos etc.

A classificação mostra o lugar que cabe a um conceito no meio de outros conceitos. Serve, portanto, para delimitar conceitos. Mas é um meio bastante demorado. Se para explicar o que é um romance fosse preciso enumerar todos os tipos de livros... Há, porém, um meio mais rápido e conciso para expressar o que uma coisa é, ou seja, sua essência. Tal meio é a definição. Tomemos o conceito “homem”. Sua definição é “animal racional”. podemos observar o seguinte:

1 – Tomou-se o primeiro conceito superior “animal” mais outro conceito “racional”. “Artista” é o primeiro conceito superior de músico, bailarino, poeta, pintor. Para definir o conceito “músico” devemos dizer que é um artista e acrescentar respectivamente o conceito “de sons, de movimentos,” etc.

2- Na definição de homem vimos: foi dito (predicado) que o homem é um animal racional. Mas de um gato posso igualmente dizer: O gato é animal. O significado nos dois casos do conceito ficou o mesmo (substância, corpórea, viva, sensitiva), mas é óbvio que o conceito “animal” num e noutro caso foi usado de MODO diferente ou sob títulos diferentes. Num caso como “animal” simplesmente, no outro caso como “animal racional”. Vê-se, portanto, que há DIVERSOS MODOS segundo os quais um e mesmo conceito pode ser dito de um sujeito. Estes modos chamam-se PREDICÁVEIS, porque são predicados de um sujeito, mas de modos diferentes.

3 – Como predicado, dizem algo da ESSÊNCIA do sujeito ou daquilo que se acrescenta à ESSÊNCIA. Naturalmente, o que faz parte da essência pode fazer também parte da definição (pois definir é expressar a essência), enquanto aquilo que não pertence à essência há de ficar de lado.

Os PREDICÁVEIS são cinco, três dos quais de essência.

a) GÊNERO (ou essência determinável): é um conceito universal que detém apenas PARCIALMENTE o sujeito de que é dito. Exemplo: O homem é animal. O gato é um ser vivo. O círculo é uma figura.

b) ESPÉCIE (ou essência determinada): é um conceito universal que determina COMPLETAMENTE o sujeito de que é dito. Temos aqui a definição perfeita. Exemplo: O homem é um animal racional. O círculo é uma figura de pontos eqüidistantes.

c) DIFERENÇA ESPECÍFICA (ou essência determinante): é um conceito universal que faz diferir uma espécie da outra dentro do mesmo gênero. Exemplo: O homem é animal racional (homens e brutos: dif. Esp.: a racionalidade).

d) PRÓPRIO: é um conceito universal que é dito do sujeito como algo que flui de sua essência e que por isso é capaz de algo específico: só o homem é capaz de ler, escrever, perguntar etc.

e) ACIDENTE: é um conceito universal dito do sujeito como qualidade não necessária, por isso é acidental. Por exemplo: Pedro é esperto.

É importante saber usar os conceitos para definir. Seria muito impreciso definir o homem como “bípede pelado” (acidente) ou qualificá-lo unicamente como “animal” (gênero), ou que ele “sabe ler” (próprio).

GÊNERO é aquela parte geral que uma espécie sob consideração tem em comum com outra espécie. Daí ser dito de várias coisas que diferem segundo a espécie. Por ex.: homem, cavalo, gato, mosca etc. Mas o que devem ter em comum há de pertencer à essência. Assim 50 pessoas podem ter em comum de serem carecas, mas isto não faz com que “careca” seja um gênero do conceito “homem” pois não é da sua essência. Ora, um GÊNERO que é um CONCEITO, não uma coisa, pode ter acima de si outro gênero, que será, portanto, um conceito superior com relação a este e assim por diante. Exemplo: “Homem” é do gênero “animal”, mas “animal” pertence ao gênero “vivo”, este ao gênero “corpo” e este ao gênero “substância”. O CONCEITO com a maior extensão leva o nome de “gênero supremo”, os demais, de “gêneros intermediários”, até chegarmos ao chamado “gênero ínfimo”, que tem debaixo de si a espécie e essa tem debaixo de si os indivíduos. Pedro e João pertencem à espécie “homem”, têm como gênero próximo o conceito “animal”, como gênero mais remoto os conceitos “vivo” e “corpo” e como gênero supremo o conceito “substância”. Jacó e Chico são violinistas, logo, pertencem à espécie “violinista”, têm como gênero próximo o conceito “músico”, como gênero mais remoto o conceito “artista”.

ESPÉCIE expressa a essência completa de uma coisa, mas expressa esta pelo gênero próximo, que dá a parte que a coisa em apreço tem em comum com outras espécies e pela diferença específica, que dá a parte pela qual a coisa se distingue justamente de qualquer outra espécie do mesmo gênero. Ex.: O homem é animal racional. Ser “animal” ele tem em comum com o gato etc. Ser racional o distingue do gato etc.

DIFERENÇA ESPECÍFICA é o elemento que faz diferir uma espécie de um gênero da outra espécie no mesmo gênero. “Racional”, a diferença específica no caso do homem, faz a espécie “animal racional” diferir de outras espécies do gênero “animal”, como gato etc.

PRÓPRIO não é essência, mas provém dela como efeito. Ser capaz de ler provém da essência racional do homem.

ACIDENTE é, como tal, qualidade não necessária. Ser careca ou gordo é acidental.

Devemos ter presente que a “ to on”, a “coisa” provém da physis, basta olhar tanto para fora de nós como para dentro de nós. Como diz Caeiro:

O universo não é uma idéia minha.

A minha idéia de universo é que é uma idéia minha.

Para que eu tenha uma idéia de universo só a posso ter porque antes o universo já se doou ao se mostrar como universo, fonte da minha idéia. E quem assim se doa é a physis, o ser. Mas ele é tão enigmático que até se pode doar como algo abstrato para eu o poder apreender como conceito, limite de nossa liminaridade, mas não de nosso entre-ser. Pois a physis é um permanente acontecer-apropriante e nisso consiste a sua identidade que é a nossa.

Um comentário:

Anônimo disse...

Aprendi muito