10 junho 2008

Suporte. Que suporte?



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Sem por quê!
 
A rosa é sem por quê,
Floresce por florescer,
Não considera a si mesma
Nem pergunta se alguém a vê.
(Ângelus Silesius)

Não há suporte que suporte o incontrolável florescer do viver.
Não há suporte que suporte a irreprimível procura da felicidade.
Não há suporte que suporte o incontornável fogo do amar.
Não há suporte que suporte a inquestionável convivência com a morte.
Não há suporte que suporte a inclassificável diversidade do real.
Não há suporte que suporte a inecessidade de uma finalidade.
Não há suporte que suporte a inutilidade da arte.
Não há suporte que suporte a inexplicável vigência poética da música.
Não há suporte que suporte a imponderável densidade do silêncio.
Não há suporte que suporte a insuportável simplicidade da coisa.
Não há suporte que suporte a insustentável leveza do ser.
Não há suporte que suporte o irracional vigorar do não-ser.
Não há suporte que suporte a incoesão e incoerência da sabedoria
Não há suporte que suporte o sem por quê de qualquer suporte.
Querer analisar uma obra de arte é como querer medir o horizonte. Não há teoria, paradigma ou suporte que o consiga. Só nos resta, diante do operar da obra em sua disputa de terra e mundo, o diálogo de escuta de identidade e diferença do horizonte, jogo misterioso do dissimular do Entre-ser, em que o humano do homem acontece, sempre poeticamente, no paradoxal horizonte de limite e não-limite nem fim, em sua dissimulação abismal.

Fernando Pessoa / Alberto Caeiro

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Nem sempre consigo sentir o que sei que devo sentir.
O meu pensamento só muito devagar atravessa o rio a nado
Porque lhe pesa o fato que os homens o fizeram usar.
Procuro despir-me do que aprendi,
Procuro esquecer-me do modo de lembrar que me ensinaram,
E raspar a tinta com que me pintaram os sentidos,
Desencaixotar as minhas emoções verdadeiras,
Desembrulhar-me e seu eu, não Alberto Caeiro,
Mas um animal humano que a Natureza produziu.
(CAEIRO, Alberto. In: Fernando Pessoa. S. Paulo, Cia. das Letras, 2004, p. 84)


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"Constituição íntima das cousas"...
"Sentido íntimo do Universo"...
Tudo isto é falso, tudo isto não quer dizer nada.
É incrível que se possa pensar em cousas dessas.
É como pensar em razões e fins
Quando o começo da manhã está raiando, e pelos lados das árvores
Um vago ouro lustroso vai perdendo a escuridão
.
(Idem, p. 32)

CAEIRO
O universo não é uma idéia minha.
A minha idéia de universo é que é uma idéia minha.
A noite não anoitece pelos meus olhos.
A minha idéia da noite é que anoitece por meus olhos.
Fora de eu pensar e de haver quaisques pensamentos
A noite anoitece concretamente
E o fulgor das estrelas existe como se tivesse peso.
(Idem. 129)

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