(Apresentação de "A origem da obra de arte", de Martin Heidegger)
O leitor que se dispuser a ler atenta e de uma maneira proveitosa o ensaio que tem em mãos deve ter em mente algumas dificuldades e desafios, que devem ser transformados paciente e decididamente em experienciações de vida (e não em simples vivências estéticas ou racionais). Isto exige do leitor uma abertura e escuta essenciais, pois o diálogo com este ensaio pressupõe também e desde o princípio um auto-diálogo.
E o primeiro a se dar conta das dificuldades foi o próprio autor. É o que assinala no Aditamento, escrito para esclarecer algumas contradições aparentes, apontadas pelos críticos em seu ensaio, porque justamente não se abriram para a atitude de questionamento que o ensaio propõe. Diz:
§208 – Permanece uma inevitável carência: que o leitor que adentra, naturalmente de fora, este ensaio, de início e continuamente, não conceba nem interprete as questões a partir da silenciosa fonte originária, de onde brota o que é para ser pensado. Porém, para o próprio autor, permanece a carência de, em cada uma das diferentes estações do caminho, a cada vez, falar justamente a linguagem propícia.
Que advertências essenciais aqui aparecem? A primeira diz respeito à atitude do leitor. Se este, “de fora”, quiser compreender o que diz o ensaio, não conseguirá. A expressão “de fora” diz aí tanto uma atitude objetiva quanto uma subjetiva. E há outra fora dessas duas? Há. O leitor deve se deixar tomar pelas questões. Não somos nós que temos ou não as questões. As questões é que nos têm. Cabe a cada leitor responder e corresponder ao seu apelo, um apelo que vem da “silenciosa fonte originária”. Já o autor, em relação às questões, está consciente também de sua dificuldade, de sua carência, manifestada na difícil tarefa de para cada uma encontrar a “linguagem propícia”.
Como Heidegger elaborou o ensaio? Em primeiro lugar o autor tece um discurso contido em torno das questões que estão em causa. Nenhuma palavra é inútil ou redundante, evitando o linguajar retórico de sinônimos que nada acrescentam ou frases bonitas com imagens aleatórias. Sua linguagem é extremamente despojada e densa. Exige uma atenção permanente a cada passo dado. Na condução do pensamento, seu modo de expor tem uma condução irônica, podendo levar a entendimentos equivocados se a leitura é feita superficialmente, pois ele apresenta a versão metafísica da questão de uma maneira clara e convincente, mas na qual não acredita. No fundo, ele propõe um diálogo permanente com a visão e conceitos metafísicos. E procede à exposição destes dentro de um encadeamento muito lógico, até se defrontar com alguma inconsistência ou paradoxo. Refaz, então, o caminho numa nova direção, onde expõe seu pensamento e entendimento das questões. Por isso, no fundo, há sempre um diálogo com a metafísica, tendo por isso mesmo uma abrangência muito grande. O leitor deve estar atento a esta abrangência.
É nessa dinâmica que ele estruturou o presente ensaio. O título já nos dá as três questões fundamentais, em torno das quais será vista a questão da arte. Esta será encarada como uma questão e não se trata para ele de expor uma nova teoria conceitual que explique o que é a arte. E por que a arte é uma questão? Como questão ela não pode ser resolvida em conceitos, mas antes de tudo deve ser experienciada. Por isso toda a tessitura do ensaio se moveu no intuito de ver melhor o enigma ou questão que é a arte: “§187 – As reflexões precedentes dizem respeito ao enigma da arte, ao enigma que é a própria arte. Está longe a pretensão de resolver o enigma. Resta a tarefa de ver o enigma”.
É por um tal intuito que centraliza sua reflexão em torno das três questões enunciadas no título: o originário, a obra, a arte. Para tratar delas desenvolve o ensaio em quatro grandes partes: uma introdução: §§ 1 a 11, A coisa e a obra, §§12 a 65, A obra e a verdade, §§ 66 a 119, A verdade e a arte, §§ 120 a 186. Posteriormente foi acrescido um Posfácio, §§ 187 a 194, e um Aditamento, §§ 195 a 208.
A questão primeira e permanente diz respeito ao originário. Nele se concentra todo o esforço de reflexão. A questão do ser da obra de arte e do ser da arte encontram na questão do originário o seu lugar apropriado. É ela que se torna a questão diretriz do título. É ela que inaugura as reflexões que percorrem todo o ensaio. Por isso será a primeira palavra do ensaio e encerra-o com uma citação de Hölderlin, onde ela também aparece. O horizonte que ela descortina só vai aparecer no final do ensaio, mais precisamente dos §§ 180 a 186, quando então ela é exposta em toda a sua amplitude, tendo em vista todas as reflexões em torno das duas outras questões enunciadas no título: o ser da obra de arte e o ser da arte. E é também a questão do originário que é retomada no parágrafo final do Aditamento, quando diz: “§208 – Permanece uma inevitável carência “... que o leitor ... não conceba nem interprete as questões a partir da silenciosa fonte originária...”. Portanto, a questão do originário começa e termina circularmente o ensaio. Sem dúvida alguma, tal questão é diretriz e em torno dela se articulam as demais, especialmente as que comparecem no título: obra e arte.
Atentos a esse fato, torna-se decisiva a compreensão do que é o originário, pois o seu emprego é ambíguo no ensaio, porque ora se refere ao pensamento originário, e então traduzimos Ursprung por originário, ora se refere ao pensamento metafísico, e a traduzimos por origem. Uma nota no final da tradução explica esta dupla tradução.
As questões da obra e da arte terão enfoques diferentes, dependendo do sentido em que se toma a palavra Ursprung. Entendemos que as três grandes partes em que dividiu o ensaio estão orientadas por esse duplo sentido. E as questões aí levantadas dizem respeito ao duplo encaminhamento.
O modo de pensar de Heidegger se pauta, em geral, por um procedimento metodológico bem preciso. No presente ensaio, ele o discute brevemente nos parágrafos introdutórios (confira a nota Círculo, §5). Em seguida expõe a concepção metafísica corrente e geral da obra de arte nos §§ 6 a 11. Segundo a visão estético-metafísica, a obra de arte é constituída de um suporte coisal a que é acrescentado algo simbólico ou alegórico. Esse suporte pode receber diferentes denominações: suporte, base, conteúdo, fundo, fundamento, matéria. Como ele precede o simbólico e o alegórico, é isso que ele vai questionar em primeiro lugar. Indiretamente, ao questionar o suporte coisal, também o simbólico e o alegórico estarão sendo questionados, porque dependem da essência desse suporte coisal, sem o qual não subsistem. E então vamos ter a primeira parte do ensaio que ele coerentemente intitulou: A coisa e a obra.
Todo o questionamento da coisa já se faz, porque é decorrente disso, a partir da questão: O que é isto o originário? Pois a questão do originário se dirige à realidade quando se pergunta, entre os pensadores gregos, pela “arché” da physis, de “ta onta”, do “on”. (Para melhor compreender esta questão em torno do “isto”, o leitor deve ler atentamente o ensaio O que é isto – a filosofia, indicado na bibliografia, no final desta apresentação). O que Heidegger vai fazer é retomar esse questionamento em torno da realidade pensada esteticamente como suporte coisal, mas tendo em mente perguntar pela “arché” da arte.
Dentro de um pensamento poético-circular, é necessário fazer todo o caminho. E a coisa como questão só chegará à arte como questão, sendo a mesma questão, depois de examinar cuidadosamente os passos dessa caminhada. Por isso vai expor, na primeira parte, – A coisa e a obra –, as três respostas metafísicas conceituais à pergunta pelo “isto” da coisa, ou seja, pelo que constitui a sua “arché”, a sua essência, o seu originário, a sua verdade. Segundo Heidegger, as três respostas têm algo em comum: elas agridem a coisalidade da coisa. Não deixam o ser coisa da coisa repousar em-si. É que as três respostas foram transformadas, na caminhada ocidental, em conceitos e essências causais. A “arché”, interpretada como fundamento causal, tem seu “telos” transformado em finalidade. Porém, a palavra grega “telos” não diz, em primeiro lugar, finalidade, mas plenitude de sentido, ou seja, a “arché” no vigor máximo do seu repouso.
Heidegger recusa tais interpretações, que deram origem a todas as Teorias Estéticas. Então o caminho de procura da coisalidade da coisa tem que ser abandonado, porque esse caminho não surge de um questionamento poético da obra de arte, mas das Teorias Estéticas. Compreender, portanto, o originário dentro das Teorias Estéticas é compreendê-lo como origem, numa visão essencialista causal e é não compreendê-lo no que ele é como “arché” originário. Terminada essa primeira parte do ensaio, a pergunta a ser colocada deve retornar ao enunciado no título: O originário da obra de arte.
Ao afastar-se da pergunta metafísica e estética, que separa na obra de arte o seu aspecto artístico (o simbólico e o alegórico) e o seu aspecto coisal (o suporte coisal ou teórico), preparou o leitor, com quem dialoga, para a pergunta pelo originário da obra de arte. Com essa pergunta Heidegger se afasta do caminho metafísico e pode dar início ao questionar originário da obra de arte. Esse questionar deverá ser, por necessidade essencial, dialogal-circular. E, por isso, será dividido em duas partes. A primeira recebeu o título: A obra e a verdade. A segunda: A verdade e a arte.
Se a primeira parte tinha como tema a coisa e a obra, ao afastar a “coisa” vista metafísica e causalmente, o que fica inicialmente em questão é a obra. Se justapusermos os dois títulos ficam:
A coisa e a obra / A obra e a verdade.
Notamos imediatamente que a obra se torna o elo comum ao questionamento, mas agora ela será vista a partir da verdade e não mais a partir da pergunta estética pelo suporte coisal. O questionamento do que é a obra é o questionamento do que é a verdade. Mas não podemos esquecer que a pergunta que a tudo precede é a pergunta pelo originário. Por isso, perguntar pela verdade da obra é perguntar pelo originário, ou seja, o pensador não pensa a verdade enquanto um juízo lógico ou de adequação entre a estrutura coisal e a estrutura lógica ou juízo lógico, enunciado na proposição, isto é, um juízo de representação como verdadeiro.
Perguntar pela verdade da obra é perguntar pela realidade da obra. À verdade corresponde a realidade e a realidade deve corresponder ao originário. Em vista disso, a essência da verdade ele a vai pensar no originário como essência essencial, pois a essência da verdade é a verdade da essência, ou seja, na “arché” em seu “telos”. Ele a encontra na palavra grega “aletheia”, isto é, desvelamento. Mas pensar o desvelamento, enquanto a “arché” em seu “telos”, é pensar a realidade em seu “Ereignis”, ou seja, no seu acontecer poético-apropriante. A obra de arte é o acontecer poético-apropriante da verdade, é o pôr-se em obra da verdade. Um tal acontecer acontece sempre na dis-puta de Terra e Mundo. Na obra de arte nunca temos um suporte coisal que suporte o artístico, temos a verdade como dis-puta de Terra e Mundo. Na verdade da obra de arte, enquanto dis-puta, a Terra chega a ser Terra e o Mundo chega a ser Mundo. Na dis-puta acontece a clareira como o aberto da abertura. Esta é que constitui ontologicamente o ser humano. Por isso ele entendido como Da-sein, que traduzimos como Entre-ser. Esse “entre” não é o entre preposicional da gramática, mas o lugar da diferença ontológica. Eis porque a dis-puta é um acontecer poético-apropriante, ou seja, da verdade e da não-verdade, onde o ser acontecendo no Entre-ser chega a ser, como referência essencial de essência humana E ser. Esse “E” é o “entre”.
No horizonte da obra de arte como verdade, a idéia de suporte ou materialidade fica completamente afastado. E com isso, a “morphé” ou figura (forma), se inscreve na questão do limite (“peras”), mas em tensão com o Nada, o Vazio, o Não-limite, e não e jamais com a materialidade ou suporte coisal. A idéia de materialidade, até um certo sentido, faz-se presente no utensílio, mas nunca na obra de arte. É neste sentido que a obra de arte, por não ter originariamente uma finalidade, não pode ser útil ou inútil. A questão atributiva ou adjetiva decorre do primeiro conceito de “on” ou “coisa”, um conceito não originário, mas essencialista e causal. Por isso, toda classificação adjetiva será sempre metafísica e essencialista. A obra de arte manifesta a realidade enquanto verdade e não-verdade, enquanto Mundo e Terra.
Porém, ainda resta uma questão: toda obra de arte é “esta” ou “aquela” obra de arte”. E até onde a sua verdade é também e se limita a ser “esta” ou “aquela” verdade? Perderia então a verdade o seu sentido originário, porque delimitado a “esta” ou “aquela” obra de arte, a “esta” ou “aquela” verdade? O originário nunca pode ser o originário que se esgote num ente. Por isso ele é originário e não origem, nem fundamento identitário. Não é fundamento porque é um pulo primordial, ou seja, Ur-Sprung. Ele tem que ser o ser dos entes, a verdade originária dos entes. Ele tem que ser o originário enquanto ser dos entes que permanece e perdura na mudança e manifestação dos entes em seu “telos”. Mas aqui “telos” como o advir à plenitude do repouso. O que está aqui em questão é algo enigmático e ambíguo: a referência entre ente e ser, limite e não-limite, mudança e permanência. O que é o limite? No corpo do ensaio, trata-o como traço e figura. Porém, como é algo extremamente complexo, ele retoma essa questão nos §§ 197 a 201. Tudo isso nos leva a questionar: o que é a verdade como manifestação que perdura e permanece?
Para responder a esta questão, Heidegger desenvolve a terceira parte: A verdade e a arte. Se justapusermos o título da segunda e da terceira parte do ensaio, vamos ver logo como o círculo se realiza em torno da obra e da arte, tendo como referência, num e noutro caso, a verdade:
A obra e a verdade / A verdade e a arte.
Tanto a obra como a arte são referenciadas pela verdade. Mas como pode a verdade ser ao mesmo tempo a verdade da obra e a verdade da arte, sem que se caia num conceito de verdade essencializante e universal abstrato? Heidegger está bem consciente dessa questão e não pode cair nas soluções fáceis da metafísica e das Teorias Estéticas. Não pode reduzir tudo a uma solução epistemológica conceitual e causal, fundada no sujeito epistemológico. Deve retomar o originário no seu vigor de repouso. Em vista do domínio conceitual metafísico, o que é o repouso, é algo que exige do leitor uma abertura de pensamento e de ascese depurativa. Trata-se, na verdade, de compreender o que ele nos diz na palavra repouso. Este não é a falta de ação, mas a ação em sua plenitude. Porém, esta só acontece na vigência do originário e seu “telos”. Voltamos à questão inicial do título do ensaio, à questão do princípio da obra de arte. (Leia-se a propósito do repouso, o ensaio Serenidade, indicado na bibliografia, no final desta apresentação). O repouso como máximo de ação é uma questão fundamental para a compreensão do originário, da verdade, da realidade, da arte. Em vista disso inicia assim:
§ 130: “A verdade é não-verdade na medida em que lhe pertence o âmbito da proveniência do ainda-não- (do não-) revelado, no sentido do velamento. Ao mesmo tempo, no des-velamento como verdade vige o outro “não” de um duplo vedar. A verdade vige como tal na oposição de clareira e duplo velamento. A verdade é a disputa originário-inaugural na qual sempre de um certo modo se conquista o aberto, no qual, tudo, que como ente se mostra e subtrai, se situa, e a partir do qual tudo se retrai”.
Não é o duplo não a possibilidade maior de toda afirmação, uma afirmação que radica no originário como vigor do Nada, que sempre se retrai? Por isso diz no § 175: “O projeto poietizante provém do Nada, do ponto de vista de que ele nunca toma sua doação do corriqueiro e do existente até então. Porém, ele nunca provém do nada na medida em que o projetado através dele é apenas o destino retido do próprio Entre-ser [Da-sein] histórico”.
Este “Nada” nada tem a ver com o nada do niilismo, ele é o Nada originário da não-verdade. Acostumados a ver a verdade como o verdadeiro e este como a representação de algo ou a adequação entre o enunciado e a enunciação, remeter agora a questão da verdade para o nada originário da não-verdade, nos lança num abismo sem fundo, exigindo de nós um “salto” (Sprung). Infelizmente, formatados e domesticados pelo pensamento conceitual metafísico, pelo racionalismo moderno e idealista, onde só aparentemente se questiona, causa-nos estranheza ligar a verdade a um “salto mortal” no “abismo” (Abgrund). Nem por isso ele desaparece pela simples exercício da vontade racionalista. Ele se faz tão presente como o próprio destino, o destino de que Édipo é a grande e permanente figura-questão, porque Édipo não é algo ficcional, é a concreta imagem-questão do destino em que originariamente o ser humano já está lançado. Com ele, todo ser humano tem que se defrontar, consciente ou inconscientemente. Na realidade, a imagem-questão “salto mortal”, ou “salto originário” como verdade originária, faz parte da tradição ocidental, por mais que o homem moderno a queira negar. E quem nos mostra e demonstra isso é o poeta-pensador Octávio Paz, num ensaio fundamental a propósito da Revelação poética, que ele intitulou: “La outra orilla” (A outra margem). (Confira a bibliografia no final da apresentação). Diríamos com João Guimarães Rosa que é a Terceira margem do rio, título de um conto de Primeira estórias. (Ver bibliografia).
O Nada é longamente tratado no ensaio: O que é metafísica?, e no livro: Introdução à metafísica. (Confira as indicações bibliográficas no final desta apresentação). Depois desta caminhada toda é que Heidegger propriamente vai expor o que compreende e qual o alcance da questão central do seu ensaio ou seja, o originário enquanto verdade. Ele o explicita de um modo radical do § 180 a 186.
É no horizonte da verdade como desvelamento, em seu duplo negar, que Heidegger vai pensar O originário da obra de arte. O originário da verdade é a verdade do originário. Por isso a questão da verdade não é o núcleo fundamental apenas deste ensaio sobre a arte. Ela é a questão maior que atravessa e se faz presente como questão diretriz de toda a obra de Heidegger, porque a questão da verdade é a questão da realidade. Esta questão, além de ser tratada ao longo de todo o ensaio sobre a arte, é tematizada em outros livros e ensaios. Cabe ao leitor experienciar a questão, mergulhando nos textos de Heidegger. A retomada incessante da questão pelo próprio Heidegger já mostra a importância que essa questão tem em sua obra. E ela é, sem dúvida, também a questão para a arte, porque é a questão em que todo ser humano se debate. O conceito de arte como representação não tem a menor sustentação, nem artística, nem de pensamento, uma vez que não se pode pensar e ver a arte a partir de qualquer suporte: material ou teórico.
Não há como indicar uma ordem de leitura dos textos de Heidegger sobre verdade. Veja os seguintes títulos:
- Aletheia. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002;
- Von Wesen der Wahrheit. In: Wegmarken. Em português: Sobre a essência da verdade. In: Heidegger – Os pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1979, p. 127-145);
- Platons Lehre von der Wahrheit (Tradução francesa em: Questions II. Paris, Gallimard, 1968). In: Wegmarken, em alemão.
- De l’ essence de la vérité – approche de l’ “allegorie de la caverne” et du Théétète de Platon. Paris, Gallimard, 2001. Gesamtausgabe, Band 19. Frankfurt, Vittorio Klostermann, 1992.
- Vom Wesen der Wahrheit, Band 36/37 – Gesamtausgabe. Frankfurt, Vittorio Klostermann, 2001
- Parmenides. Band 54 - Gesamtausgabe. Frankfurt, Vittorio Klostermann, 2ª. ed. 1992. Trad. Espanhola de Carlos Másmela. Madrid, Ediciones Akal, 2005.
Pelo número de obras dedicadas à questão da verdade, o leitor pode ter uma pequena idéia do lugar fundamental dessa questão tanto para o pensamento como para a arte. Na realidade, para a vida, pois julgamos que é real o que é verdadeiro e que é verdadeiro o que é real. Notará também o leitor que ele estabelece um diálogo permanente com Platão. É importante que o leitor saiba que o Platão que emerge desse diálogo ainda é o Platão pensador e não aquele que o platonismo reduziu a um ismo doutrinal, cheio de conceitos, e do qual se ausentaram as questões.
Quando agora olhamos os diferentes títulos das partes do ensaio e vemos que há uma profunda interligação, não podemos deixar de chamar atenção para uma correlação final. O título da primeira parte diz: A coisa e a obra. culo se completa em torno da obra e da arte, tendo como refere manifestaçpaerguntao tçara os valores dos procedimentos teO título da terceira parte diz: A verdade e a arte. Justapostos ficam:
A coisa e a obra / A verdade e a arte.
Então perguntamos: qual a relação entre “coisa” e “arte”?, uma vez que uma dá início ao questionamento e a outra o encerra. Se pensarmos, como foi feito no percurso de todo o ensaio, circularmente, veremos que a questão da “coisa” recebe no ensaio dois encaminhamentos: o primeiro diz respeito aos conceitos metafísicos e à sua compreensão causal finalista. Olhando agora o título do ensaio: O originário da obra de arte, notamos que há um segundo encaminhamento, onde é a arte, a partir do originário, que nos abre o caminho para o que propriamente é “coisa”. O originário, a coisa e a arte remetem para o mesmo, mas não são a mesma coisa. Por isso ele pode afirmar no § 204: “... o que é a arte é uma daquelas perguntas a que no ensaio não é dada nenhuma resposta. O que parece ser resposta não passa de orientação para o questionamento”.
Esta afirmação do autor deve deixar bem claras três questões:
1ª. “§ 204. A arte não é tomada nem como um campo de realização cultural nem como uma manifestação do Espírito. Ela pertence ao acontecer-poético-apropriante [Ereignis], a partir do qual se determina o “sentido do ser” (compare Ser e Tempo)”.
Neste sentido, o ensaio se inscreve, como não poderia deixar de ser, na questão central da obra heideggeriana, que tem como mote a pergunta pelo esquecimento do sentido do ser, pela verdade do ser. É neste horizonte que se pensa o originário da obra de arte. Isto pressupõe que o leitor do ensaio, para que o compreenda, se lance nesse questionamento essencial que deve ser acompanhado pela leitura de outras obras e ensaios de Heidegger. Fazendo isso não estará apenas dialogando com as obras do autor, mas estará se abrindo para um diálogo com o pensamento metafísico ocidental. E esta, sem dúvida, é uma das maiores dificuldades para o leitor: ter um mínimo de conhecimento de todo este longo e complexo percurso filosófico, mas que por si não resolve, se for algo externo e conceitual. É decisivo que se abra para o que permanente e originariamente está sempre em questão, que se abra, enfim, para a história e estória do ser, da verdade do ser. Feito isso, poderá dialogar também com as obras de pensamento e com o pensamento poético de diferentes culturas e épocas.
2ª. Quando o autor caracteriza a obra de arte como “pôr-em-obra da verdade” fica implícita uma ambigüidade essencial. Quem é o sujeito de pôr? A verdade tanto pode ser o sujeito como o objeto, mas esta dualidade é imprópria. Na realidade e em verdade a arte é pensada a partir do acontecer-poético-apropriante originário. Este acontecer está para além da relação sujeito/objeto, porque o ser é apelo destinal aos homens, mas não sem estes. A essência do humano é o ser humano como lugar do acontecer poético-apropriante deste apelo destinal. No ser o lugar do acontecer deste apelo, é que o ser homem chega propriamente ao seu ser, isto é, ao humano. Neste sentido, toda obra de arte como lugar da verdade diz respeito ao lugar do humano como obra-de-arte, isto é, como o desvelar do humano.
3ª. Neste horizonte do desvelar do humano como obra-de-arte, coloca-se a questão permanente para todas as épocas e seres humanos: “... a referência do ser e da essência humana” § 206. Devemos entender aí como referência algo radical e enigmático. Eis o motivo pelo qual o autor logo a seguir diz aí mesmo que ela é “uma dificuldade aflitiva”. Por quê? Todo o esforço do pensador em pensar a referência do ser da obra de arte e do ser da arte encontra na referência da essência humana e do ser o seu horizonte de tentativa de compreensão.
De imediato, o que sempre se dá é o ente, é a obra de arte. Isto é tranqüilo e incontestável. Porém, não é meu pensar ou ver que põe o ente. Ele, originariamente, já se dá. Sem o dar-se eu não poderia nem vê-lo nem pensá-lo. De tudo que se dá a ver, vemos muito pouco e o pensamos ainda menos. De tudo que se dá a ver, é muito, mas muito mais o que não vemos e nem pensamos. Querer reduzir o que se dá a ver a qualquer perspectivismo ou jogo perspectivista subjetivo-epistemológico é jogar o jogo da avestruz. A vida num milímetro de terra é incomensuravelmente maior do que podemos detectar e ver. Para além do consciente há irrefutavelmente o inconsciente. Cada ente também não se põe a si mesmo. Ele é uma doação do ser, no sentido da verdade do ser. (Confira na bibliografia da Apresentação, de Heidegger: Tempo e ser).
É nesse dar-se que o ente chega à sua verdade e o ser homem chega ao que lhe é próprio: o humano, como a verdade do que é, como o que lhe é próprio. Mas o que antes de tudo é é o ser. Nessa referência acontecem duas questões essnciais: 1ª. O ser como originário dos entes, mas não como origem nem como essência universal abstrata. Isso fica muito evidente quanto constatamos que não é através de um conceito geral de arte que podemos chegar a conhecer “esta” ou “aquela” obra de arte no que ela é “esta” ou “aquela” obra de arte. O universal abstrato não dá conta da singularidade de cada obra, mas esta também só pode viger pelo vigor do originário.
Há uma referência necessária entre obra de arte e arte, assim como há uma referência necessária entre essência do humano e ser. Este “e” (o “entre”) não indica uma simples adição, mas o originário onde acontece a vigência da arte como o vigente da obra de arte. Por isso, esse “e/entre” originário foge à classificação alternativa de sujeito ou objeto, justamente por ser o originário concreto do universal e do singular;
2ª. É no âmbito do originário que Heidegger vai pensar a questão do criador/autor e do leitor/desvelador. O criador não é criador a partir de sua vontade ou imaginação, mas a partir do acontecer, nele, do originário como verdade. É o que Heidegger encaminha como Ereignis, o acontecer poético-apropriante.
Deixando acontecer nele a verdade, a obra é obra de arte, pois a arte é o pôr-se-em-obra da verdade. Esta é a grande tese do ensaio, mas numa nota posterior, de 1960, o autor sugere a substituição de “pôr em obra” por, porque diz melhor: “trazer-à-obra, pro-duzir, trazer enquanto deixar; poiesis”, § 196 (a).
Se o autor não é autor a partir de sua vontade e decisão, também o leitor não é o sujeito do ler. O leitor é leitor quando deixa o logos ser logos, no e como diá-logo. O acontecer do logos na leitura do leitor só acontece quando o leitor faz da leitura um desvelo (como o desvelo da mãe para com o filho). O desvelo traz em si a obediência à fala da verdade da obra de arte no acontecer poético-apropriante, no acontecer do logos. Desvelo é sempre um diálogo amoroso com a verdade da arte. O desvelo amoroso é um desvelamento no sentido grego de aletheia. E esta é o desvelamento da realidade como verdade. Temos, portanto, aí a referência de leitor e obra de arte como desvelo, porque acontece o desvelamento, a verdade.
À leitura como referência de leitor e obra de arte, Heidegger denominou: Bewahrung, guarda, conservação. É, em princípio, estranho que o autor, formado numa tradição hermenêutica, não tenha preferido esta palavra àquela. Naquela palavra ressoa o cuidar que conserva. O verbo bewahren significa conservar, não esquecer. O cuidar que conserva é o conservar do persistir e perdurar do que propriamente é a verdade, daí a ligação de Bewahrung com Wahrheit (verdade), que o pensador pensa como aletheia/desvelamento e Ereignis. O desvelo é um deixar perdurar o que acontece e permanece na constância do originário: “ ‘Wesen’, ‘viger’ é a mesma palavra que ‘währen’, ‘durar’, ‘permanecer’, ‘ficar’. Pensamos a vigência como a duração daquilo que, tendo chegado a desencobrir-se, assim perdura e permanece”. (Conferir na bibliografia no fim da apresentação Ensaios e conferências, p. 43). Wahrheit e Bewahrung têm o mesmo étimo do antigo alto-alemão: wara. Em Carta sobre o humanismo, p. 24, diz: “A linguagem é a casa do Ser. Em sua habitação mora o homem. Os pensadores e poetas lhe servem de vigias. Sua vigília [desvelo] é con-sumar a manifestação do Ser, porquanto, por seu dizer, a tornam linguagem e a conservam [aufbewahren] na linguagem” (conf. bibliografia). O conservar, em alemão, aufbewahren, na linguagem é o desvelo, o amor como vigor originário de união (logos). A vigília como desvelo também indica a presença cuidadosa e amorosa perante o que se vela e é misterioso. No “velório” não se vela simplesmente o morto, vela-se no morto o mistério da morte. E o interessante na palavra portuguesa des-velo, é que esse prefixo não indica negação, mas intensificação, no desvelo acontece o velar densificado pelo cuidado amoroso, pelo que está sendo velado e a partir do que se vela.
Também os leitores são solicitados à mesma vigília dos poetas e pensadores, porque os três precisam ser tomados pelo cuidado do que é digno de ser pensado: a verdade do sentido do ser, o mistério velado da verdade do ser. Toda vigília ou desvelo só é se for Ereignis, o acontecer poético-apropriante ou verdade. A constância do originário [wesen] como verdade é o amor originante. O desvelo é um deixar acontecer do saber como sabor do saber amoroso. É o que o pensador Platão denominou filos-sofia: o amor do saber.
Além disso, a palavra filosofia diz mais do que isso, de forma mais primigênia outra coisa. Filosofia é a junção de duas palavras, mas que significam um pouco mais do que amar o saber. Philos é originariamente, na língua grega, um pronome possessivo que dá conta do que pertence a alguém de maneira irreversível, tal como o nosso joelho nos pertence. Não diz então philos de qualquer espécie de posse transitória. Não se deve talvez nem falar, nesse caso, de posse, mas de pertença, daquilo que nos foi dado pela natureza e que ela mesma, só por si, não nos pode tirar. Philos é, de modo radical – um próprio. Um próprio tal como uma pronúncia não é separada do que pronuncia, senão na linguagem tornada mero meio, mero instrumento de comunicação. Assim, philos é o que é próprio e não pode deixar de sê-lo. (Jardim, 2004: 102).
A partir do pensamento de Antônio Jardim, podemos fazer a ligação entre: verdade, aletheia, desvelamento, desvelo/cuidado amoroso do originário, acontecer poético-apropriante, próprio como o que é vigente e permanece, Bewahrung. Em sua vigência e persistência, o originário é amor manifestante do que ele é em sua plenitude de sentido. Em termos gregos, o originário é a “arché” em seu “telos”. O desvelo do leitor não é um ato de sua vontade, é o acontecer poético-apropriante da arte como e em sua verdade. É nesse sentido que a obra de arte é o “pôr-se-em-obra da verdade” e o leitor desvelando se desvela como a mais fundamental obra de arte, porque no desvelo vela, cuida do que é digno de ser cuidado, pensado. Como desvelo, toda leitura é um narrar inaugural, onde a realidade se desvelando faz-se mundo, no dar-se e retrair-se do ser como época. Nas épocas temos a história da verdade do ser enquanto desvelamento e velamento, enquanto Mundo e Terra. E não e jamais como amorfa cronologia causal historiográfica. Esta, para poder falar do significado causal da historiografia, só o pode, embora num reducionismo causalista empobrecedor, a partir do sentido originário da verdade do ser como acontecer poético-apropriante, Ereignis. Por isso, Heidegger, nas sucessivas edições do presente ensaio, acrescentou em nota a diversos parágrafos, a palavra Ereignis. Este acréscimo é fundamental, pois a compreensão da arte como verdade do ser significa, por seu lado, a compreensão desta como acontecer poético-apropriante. Arte, originariamente, é sempre acontecer poético-apropriante como verdade do sentido do ser.
A permanência do humano para além das vicissitudes culturais e epocais é a permanência da referência do ser e da essência humana. À permanência como vigor da mudança e na sua mútua referência é que Heidegger convida a pensar como a verdade ou O originário da obra de arte.
Nunca se sabe que tipo de leitor dialogará com as questões que no ensaio estão propostas e levantadas. Por isso a indicação de leitura de outros ensaios e obras de Heidegger ajuda na caminhada dialogante. Para isso o leitor deve estar atento à dinâmica criativa do pensamento do pensador e tornar suas as questões do pensamento poético pensante.
Heidegger reitera que não propõe nenhuma solução para o enigma ou questão que é a arte. O que isso quer dizer? Diante da questão do originário em que se move o humano do homem como próprio da arte, a dinâmica de pensamento da presente obra-ensaio move-se no questionar e dialogar, e nunca numa concatenação de conceitos fechados, comprovando uma ou mais teses prévias.
Pelo questionar e dialogar, o autor estabelece uma rede de referências entre algumas palavras essenciais em que uma solicita a outra e esta a outras. Sem o leitor apreender esta dinâmica de referências, dificilmente irá compreender o operar da obra-ensaio na solicitação de um pensar que acompanhe, enquanto diálogo, o que é posto em questão. Quando o leitor conseguir, a partir do que lhe é próprio, fazer circular em diálogo o seu pensamento com o que é proposto como questão, então O originário da obra de arte começou a acontecer.
Para facilitar este percurso, oferecemos ao leitor três recursos:
1º. No final do ensaio algumas notas explicativas quanto a opções de tradução de alguns vocábulos essenciais, na constituição do todo da obra-ensaio. Certamente haveria outras possibilidades de tradução e até podemos ter cometido algumas falhas, naturalmente inevitáveis em toda tradução. Porém, o sentido vivo do todo da obra-ensaio foi decisivo. A tradução não se constitui numa amorfa transliteração. Moveu-nos o desvelo como o próprio pensador o propõe na referência de cada leitor com as grandes obras de arte e de pensamento. Julgamos que estamos diante de uma grande obra-ensaio de pensamento.
2º. Incluimos um índice remissivo. O importante é o próprio leitor fazer do remeter de um vocábulo para outro, dentro das passagens indicadas, uma dinâmica de reflexão e pensamento. Isto é essencial porque, moldados pelo e no pensamento metafísico, o deixar acontecer do pensamento originário exige do leitor uma paciente e difícil disciplina, pois o mais simples é também o mais doloroso: deixar eclodir no ordinário e habitual o extraordinário sempre inaugural. Difícil é, impossível não, sobretudo se houver a disposição de escuta do que já desde sempre como auto-diálogo nos move: o originário como o extraordinário de todo inaugurável a que a cada dia somos convocados pela voz íntima do que nos é próprio.
3º. No ensaio, a opção de vocabulário é cuidadosamente escolhida. Porém certas palavras encontram em outros ensaios ou obras, por parte do autor, uma reflexão bem mais ampla e aprofundada. O leitor que quiser, portanto, mover-se com maior profundidade e cuidado em relação às questões, pode e até deve procurar ler, dentro do possível, esses outros ensaios ou obras. Para isso damos a seguir algumas indicações. Todas, seria impossível e deixar de reconhecer nossos limites. Vale, cremos o intuito de abrir vias de percursos inaugurais para cada leitor.
O próprio autor no decorrer do texto já faz numerosas indicações. Nem todas elas já se encontram traduzidas para o português ou não são de nosso conhecimento. Não pretendemos indicar tudo, mas o que achamos essencial dentro de nosso horizonte de conhecimento.
No final desta apresentação não poderíamos deixar de agradecer a ajuda preciosa, em passagens de difícil tradução, da Profa. Dra. Maria José P. Monteiro, do Departamento de Letras Anglo-germânicas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Bibliografia
Textos citados pelo autor no corpo do ensaio A origem da obra de arte.
1 – Hegel e os gregos. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
2 – Zur Sache des Denkens.
3 – O fim da filosofia e a tarefa do pensamento. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
4 – Sprache und Heimat.
5 – Aus der Erfahrung des Denkens.
6 – Identidade e diferença. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
7 – A coisa. Conferir a tradução portuguesa in: Ensaios e conferências. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis, Vozes, 2002.
8 – Ser e tempo. Conferir a tradução portuguesa. Trad. Márcia de Sá Cavalvanti. Petrópolis, Vozes, 2004.
9 – Zur Seinsfrage.
10 – O autor cita ainda o fragmento 53 de Heráclito.
Algumas questões que aparecem no texto do ensaio são desenvolvidas mais profundamente em outros ensaios ou obras. Nesse sentido sugerimos a leitura, para aprofundamento de:
1 – Que é isto – a filosofia? Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S.Paulo, Abril Cultural, 1979.
2 – Que é metafísica? Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
3 – Tempo e ser. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S.Paulo, Abril Cultural, 1979.
4 – Construir, habitar, pensar. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
5 – “... poeticamente o homem habita...”. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
6 – Logos (Heráclito, fragmento 50). In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
7 – Aletheia (Heráclito, fragmento 16). In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
8 – A questão da técnica. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
9 – Ciência e pensamento do sentido. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
10 – Hölderlin e a essência da poesia. Há tradução francesa, in: Approche de Hölderlin. Paris, Gallimard, 1962. Há também tradução espanhola: Trad. Juan David García Bacca. Barcelona, Anthropos Editorial, 1989
11 – A caminho da linguagem. Trad. Márcia de Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis, Vozes, 2003.
12 – Serenidade. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa, Instituto Piaget, s.d.
13 – Sobre o humanismo. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1967.
14 – Aportes a la filosofia – acerca del evento. Trad. Dina V. Picotti C. Buenos Aires, Editorial Almagesto e Editorial Biblos, 2003.
Outra bibliografia
JARDIM, Antônio. Quando a paixão é filosofia. In: CASTRO, Manuel Antônio de (org.). A construção poética do real. Rio de Janeiro, 7letras, 2004.
PAZ, Octavio. El arco y la lira. México, Fondo de Cultura Economica, 1973.
ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. Rio de Janeiro, José Olympio, 1967.
CASTRO, Manuel Antônio de. Heidegger e as questões da arte. In: A construção poética do real (org.). Rio de Janeiro, 7letras, 2004.
CASTRO, Manuel Antônio de. Interdisciplinaridade poética: o “entre”. In: Rio de Janeiro, Revista Tempo Brasileiro, 164, jan.-mar., 2006.
O leitor que se dispuser a ler atenta e de uma maneira proveitosa o ensaio que tem em mãos deve ter em mente algumas dificuldades e desafios, que devem ser transformados paciente e decididamente em experienciações de vida (e não em simples vivências estéticas ou racionais). Isto exige do leitor uma abertura e escuta essenciais, pois o diálogo com este ensaio pressupõe também e desde o princípio um auto-diálogo.
E o primeiro a se dar conta das dificuldades foi o próprio autor. É o que assinala no Aditamento, escrito para esclarecer algumas contradições aparentes, apontadas pelos críticos em seu ensaio, porque justamente não se abriram para a atitude de questionamento que o ensaio propõe. Diz:
§208 – Permanece uma inevitável carência: que o leitor que adentra, naturalmente de fora, este ensaio, de início e continuamente, não conceba nem interprete as questões a partir da silenciosa fonte originária, de onde brota o que é para ser pensado. Porém, para o próprio autor, permanece a carência de, em cada uma das diferentes estações do caminho, a cada vez, falar justamente a linguagem propícia.
Que advertências essenciais aqui aparecem? A primeira diz respeito à atitude do leitor. Se este, “de fora”, quiser compreender o que diz o ensaio, não conseguirá. A expressão “de fora” diz aí tanto uma atitude objetiva quanto uma subjetiva. E há outra fora dessas duas? Há. O leitor deve se deixar tomar pelas questões. Não somos nós que temos ou não as questões. As questões é que nos têm. Cabe a cada leitor responder e corresponder ao seu apelo, um apelo que vem da “silenciosa fonte originária”. Já o autor, em relação às questões, está consciente também de sua dificuldade, de sua carência, manifestada na difícil tarefa de para cada uma encontrar a “linguagem propícia”.
Como Heidegger elaborou o ensaio? Em primeiro lugar o autor tece um discurso contido em torno das questões que estão em causa. Nenhuma palavra é inútil ou redundante, evitando o linguajar retórico de sinônimos que nada acrescentam ou frases bonitas com imagens aleatórias. Sua linguagem é extremamente despojada e densa. Exige uma atenção permanente a cada passo dado. Na condução do pensamento, seu modo de expor tem uma condução irônica, podendo levar a entendimentos equivocados se a leitura é feita superficialmente, pois ele apresenta a versão metafísica da questão de uma maneira clara e convincente, mas na qual não acredita. No fundo, ele propõe um diálogo permanente com a visão e conceitos metafísicos. E procede à exposição destes dentro de um encadeamento muito lógico, até se defrontar com alguma inconsistência ou paradoxo. Refaz, então, o caminho numa nova direção, onde expõe seu pensamento e entendimento das questões. Por isso, no fundo, há sempre um diálogo com a metafísica, tendo por isso mesmo uma abrangência muito grande. O leitor deve estar atento a esta abrangência.
É nessa dinâmica que ele estruturou o presente ensaio. O título já nos dá as três questões fundamentais, em torno das quais será vista a questão da arte. Esta será encarada como uma questão e não se trata para ele de expor uma nova teoria conceitual que explique o que é a arte. E por que a arte é uma questão? Como questão ela não pode ser resolvida em conceitos, mas antes de tudo deve ser experienciada. Por isso toda a tessitura do ensaio se moveu no intuito de ver melhor o enigma ou questão que é a arte: “§187 – As reflexões precedentes dizem respeito ao enigma da arte, ao enigma que é a própria arte. Está longe a pretensão de resolver o enigma. Resta a tarefa de ver o enigma”.
É por um tal intuito que centraliza sua reflexão em torno das três questões enunciadas no título: o originário, a obra, a arte. Para tratar delas desenvolve o ensaio em quatro grandes partes: uma introdução: §§ 1 a 11, A coisa e a obra, §§12 a 65, A obra e a verdade, §§ 66 a 119, A verdade e a arte, §§ 120 a 186. Posteriormente foi acrescido um Posfácio, §§ 187 a 194, e um Aditamento, §§ 195 a 208.
A questão primeira e permanente diz respeito ao originário. Nele se concentra todo o esforço de reflexão. A questão do ser da obra de arte e do ser da arte encontram na questão do originário o seu lugar apropriado. É ela que se torna a questão diretriz do título. É ela que inaugura as reflexões que percorrem todo o ensaio. Por isso será a primeira palavra do ensaio e encerra-o com uma citação de Hölderlin, onde ela também aparece. O horizonte que ela descortina só vai aparecer no final do ensaio, mais precisamente dos §§ 180 a 186, quando então ela é exposta em toda a sua amplitude, tendo em vista todas as reflexões em torno das duas outras questões enunciadas no título: o ser da obra de arte e o ser da arte. E é também a questão do originário que é retomada no parágrafo final do Aditamento, quando diz: “§208 – Permanece uma inevitável carência “... que o leitor ... não conceba nem interprete as questões a partir da silenciosa fonte originária...”. Portanto, a questão do originário começa e termina circularmente o ensaio. Sem dúvida alguma, tal questão é diretriz e em torno dela se articulam as demais, especialmente as que comparecem no título: obra e arte.
Atentos a esse fato, torna-se decisiva a compreensão do que é o originário, pois o seu emprego é ambíguo no ensaio, porque ora se refere ao pensamento originário, e então traduzimos Ursprung por originário, ora se refere ao pensamento metafísico, e a traduzimos por origem. Uma nota no final da tradução explica esta dupla tradução.
As questões da obra e da arte terão enfoques diferentes, dependendo do sentido em que se toma a palavra Ursprung. Entendemos que as três grandes partes em que dividiu o ensaio estão orientadas por esse duplo sentido. E as questões aí levantadas dizem respeito ao duplo encaminhamento.
O modo de pensar de Heidegger se pauta, em geral, por um procedimento metodológico bem preciso. No presente ensaio, ele o discute brevemente nos parágrafos introdutórios (confira a nota Círculo, §5). Em seguida expõe a concepção metafísica corrente e geral da obra de arte nos §§ 6 a 11. Segundo a visão estético-metafísica, a obra de arte é constituída de um suporte coisal a que é acrescentado algo simbólico ou alegórico. Esse suporte pode receber diferentes denominações: suporte, base, conteúdo, fundo, fundamento, matéria. Como ele precede o simbólico e o alegórico, é isso que ele vai questionar em primeiro lugar. Indiretamente, ao questionar o suporte coisal, também o simbólico e o alegórico estarão sendo questionados, porque dependem da essência desse suporte coisal, sem o qual não subsistem. E então vamos ter a primeira parte do ensaio que ele coerentemente intitulou: A coisa e a obra.
Todo o questionamento da coisa já se faz, porque é decorrente disso, a partir da questão: O que é isto o originário? Pois a questão do originário se dirige à realidade quando se pergunta, entre os pensadores gregos, pela “arché” da physis, de “ta onta”, do “on”. (Para melhor compreender esta questão em torno do “isto”, o leitor deve ler atentamente o ensaio O que é isto – a filosofia, indicado na bibliografia, no final desta apresentação). O que Heidegger vai fazer é retomar esse questionamento em torno da realidade pensada esteticamente como suporte coisal, mas tendo em mente perguntar pela “arché” da arte.
Dentro de um pensamento poético-circular, é necessário fazer todo o caminho. E a coisa como questão só chegará à arte como questão, sendo a mesma questão, depois de examinar cuidadosamente os passos dessa caminhada. Por isso vai expor, na primeira parte, – A coisa e a obra –, as três respostas metafísicas conceituais à pergunta pelo “isto” da coisa, ou seja, pelo que constitui a sua “arché”, a sua essência, o seu originário, a sua verdade. Segundo Heidegger, as três respostas têm algo em comum: elas agridem a coisalidade da coisa. Não deixam o ser coisa da coisa repousar em-si. É que as três respostas foram transformadas, na caminhada ocidental, em conceitos e essências causais. A “arché”, interpretada como fundamento causal, tem seu “telos” transformado em finalidade. Porém, a palavra grega “telos” não diz, em primeiro lugar, finalidade, mas plenitude de sentido, ou seja, a “arché” no vigor máximo do seu repouso.
Heidegger recusa tais interpretações, que deram origem a todas as Teorias Estéticas. Então o caminho de procura da coisalidade da coisa tem que ser abandonado, porque esse caminho não surge de um questionamento poético da obra de arte, mas das Teorias Estéticas. Compreender, portanto, o originário dentro das Teorias Estéticas é compreendê-lo como origem, numa visão essencialista causal e é não compreendê-lo no que ele é como “arché” originário. Terminada essa primeira parte do ensaio, a pergunta a ser colocada deve retornar ao enunciado no título: O originário da obra de arte.
Ao afastar-se da pergunta metafísica e estética, que separa na obra de arte o seu aspecto artístico (o simbólico e o alegórico) e o seu aspecto coisal (o suporte coisal ou teórico), preparou o leitor, com quem dialoga, para a pergunta pelo originário da obra de arte. Com essa pergunta Heidegger se afasta do caminho metafísico e pode dar início ao questionar originário da obra de arte. Esse questionar deverá ser, por necessidade essencial, dialogal-circular. E, por isso, será dividido em duas partes. A primeira recebeu o título: A obra e a verdade. A segunda: A verdade e a arte.
Se a primeira parte tinha como tema a coisa e a obra, ao afastar a “coisa” vista metafísica e causalmente, o que fica inicialmente em questão é a obra. Se justapusermos os dois títulos ficam:
A coisa e a obra / A obra e a verdade.
Notamos imediatamente que a obra se torna o elo comum ao questionamento, mas agora ela será vista a partir da verdade e não mais a partir da pergunta estética pelo suporte coisal. O questionamento do que é a obra é o questionamento do que é a verdade. Mas não podemos esquecer que a pergunta que a tudo precede é a pergunta pelo originário. Por isso, perguntar pela verdade da obra é perguntar pelo originário, ou seja, o pensador não pensa a verdade enquanto um juízo lógico ou de adequação entre a estrutura coisal e a estrutura lógica ou juízo lógico, enunciado na proposição, isto é, um juízo de representação como verdadeiro.
Perguntar pela verdade da obra é perguntar pela realidade da obra. À verdade corresponde a realidade e a realidade deve corresponder ao originário. Em vista disso, a essência da verdade ele a vai pensar no originário como essência essencial, pois a essência da verdade é a verdade da essência, ou seja, na “arché” em seu “telos”. Ele a encontra na palavra grega “aletheia”, isto é, desvelamento. Mas pensar o desvelamento, enquanto a “arché” em seu “telos”, é pensar a realidade em seu “Ereignis”, ou seja, no seu acontecer poético-apropriante. A obra de arte é o acontecer poético-apropriante da verdade, é o pôr-se em obra da verdade. Um tal acontecer acontece sempre na dis-puta de Terra e Mundo. Na obra de arte nunca temos um suporte coisal que suporte o artístico, temos a verdade como dis-puta de Terra e Mundo. Na verdade da obra de arte, enquanto dis-puta, a Terra chega a ser Terra e o Mundo chega a ser Mundo. Na dis-puta acontece a clareira como o aberto da abertura. Esta é que constitui ontologicamente o ser humano. Por isso ele entendido como Da-sein, que traduzimos como Entre-ser. Esse “entre” não é o entre preposicional da gramática, mas o lugar da diferença ontológica. Eis porque a dis-puta é um acontecer poético-apropriante, ou seja, da verdade e da não-verdade, onde o ser acontecendo no Entre-ser chega a ser, como referência essencial de essência humana E ser. Esse “E” é o “entre”.
No horizonte da obra de arte como verdade, a idéia de suporte ou materialidade fica completamente afastado. E com isso, a “morphé” ou figura (forma), se inscreve na questão do limite (“peras”), mas em tensão com o Nada, o Vazio, o Não-limite, e não e jamais com a materialidade ou suporte coisal. A idéia de materialidade, até um certo sentido, faz-se presente no utensílio, mas nunca na obra de arte. É neste sentido que a obra de arte, por não ter originariamente uma finalidade, não pode ser útil ou inútil. A questão atributiva ou adjetiva decorre do primeiro conceito de “on” ou “coisa”, um conceito não originário, mas essencialista e causal. Por isso, toda classificação adjetiva será sempre metafísica e essencialista. A obra de arte manifesta a realidade enquanto verdade e não-verdade, enquanto Mundo e Terra.
Porém, ainda resta uma questão: toda obra de arte é “esta” ou “aquela” obra de arte”. E até onde a sua verdade é também e se limita a ser “esta” ou “aquela” verdade? Perderia então a verdade o seu sentido originário, porque delimitado a “esta” ou “aquela” obra de arte, a “esta” ou “aquela” verdade? O originário nunca pode ser o originário que se esgote num ente. Por isso ele é originário e não origem, nem fundamento identitário. Não é fundamento porque é um pulo primordial, ou seja, Ur-Sprung. Ele tem que ser o ser dos entes, a verdade originária dos entes. Ele tem que ser o originário enquanto ser dos entes que permanece e perdura na mudança e manifestação dos entes em seu “telos”. Mas aqui “telos” como o advir à plenitude do repouso. O que está aqui em questão é algo enigmático e ambíguo: a referência entre ente e ser, limite e não-limite, mudança e permanência. O que é o limite? No corpo do ensaio, trata-o como traço e figura. Porém, como é algo extremamente complexo, ele retoma essa questão nos §§ 197 a 201. Tudo isso nos leva a questionar: o que é a verdade como manifestação que perdura e permanece?
Para responder a esta questão, Heidegger desenvolve a terceira parte: A verdade e a arte. Se justapusermos o título da segunda e da terceira parte do ensaio, vamos ver logo como o círculo se realiza em torno da obra e da arte, tendo como referência, num e noutro caso, a verdade:
A obra e a verdade / A verdade e a arte.
Tanto a obra como a arte são referenciadas pela verdade. Mas como pode a verdade ser ao mesmo tempo a verdade da obra e a verdade da arte, sem que se caia num conceito de verdade essencializante e universal abstrato? Heidegger está bem consciente dessa questão e não pode cair nas soluções fáceis da metafísica e das Teorias Estéticas. Não pode reduzir tudo a uma solução epistemológica conceitual e causal, fundada no sujeito epistemológico. Deve retomar o originário no seu vigor de repouso. Em vista do domínio conceitual metafísico, o que é o repouso, é algo que exige do leitor uma abertura de pensamento e de ascese depurativa. Trata-se, na verdade, de compreender o que ele nos diz na palavra repouso. Este não é a falta de ação, mas a ação em sua plenitude. Porém, esta só acontece na vigência do originário e seu “telos”. Voltamos à questão inicial do título do ensaio, à questão do princípio da obra de arte. (Leia-se a propósito do repouso, o ensaio Serenidade, indicado na bibliografia, no final desta apresentação). O repouso como máximo de ação é uma questão fundamental para a compreensão do originário, da verdade, da realidade, da arte. Em vista disso inicia assim:
§ 130: “A verdade é não-verdade na medida em que lhe pertence o âmbito da proveniência do ainda-não- (do não-) revelado, no sentido do velamento. Ao mesmo tempo, no des-velamento como verdade vige o outro “não” de um duplo vedar. A verdade vige como tal na oposição de clareira e duplo velamento. A verdade é a disputa originário-inaugural na qual sempre de um certo modo se conquista o aberto, no qual, tudo, que como ente se mostra e subtrai, se situa, e a partir do qual tudo se retrai”.
Não é o duplo não a possibilidade maior de toda afirmação, uma afirmação que radica no originário como vigor do Nada, que sempre se retrai? Por isso diz no § 175: “O projeto poietizante provém do Nada, do ponto de vista de que ele nunca toma sua doação do corriqueiro e do existente até então. Porém, ele nunca provém do nada na medida em que o projetado através dele é apenas o destino retido do próprio Entre-ser [Da-sein] histórico”.
Este “Nada” nada tem a ver com o nada do niilismo, ele é o Nada originário da não-verdade. Acostumados a ver a verdade como o verdadeiro e este como a representação de algo ou a adequação entre o enunciado e a enunciação, remeter agora a questão da verdade para o nada originário da não-verdade, nos lança num abismo sem fundo, exigindo de nós um “salto” (Sprung). Infelizmente, formatados e domesticados pelo pensamento conceitual metafísico, pelo racionalismo moderno e idealista, onde só aparentemente se questiona, causa-nos estranheza ligar a verdade a um “salto mortal” no “abismo” (Abgrund). Nem por isso ele desaparece pela simples exercício da vontade racionalista. Ele se faz tão presente como o próprio destino, o destino de que Édipo é a grande e permanente figura-questão, porque Édipo não é algo ficcional, é a concreta imagem-questão do destino em que originariamente o ser humano já está lançado. Com ele, todo ser humano tem que se defrontar, consciente ou inconscientemente. Na realidade, a imagem-questão “salto mortal”, ou “salto originário” como verdade originária, faz parte da tradição ocidental, por mais que o homem moderno a queira negar. E quem nos mostra e demonstra isso é o poeta-pensador Octávio Paz, num ensaio fundamental a propósito da Revelação poética, que ele intitulou: “La outra orilla” (A outra margem). (Confira a bibliografia no final da apresentação). Diríamos com João Guimarães Rosa que é a Terceira margem do rio, título de um conto de Primeira estórias. (Ver bibliografia).
O Nada é longamente tratado no ensaio: O que é metafísica?, e no livro: Introdução à metafísica. (Confira as indicações bibliográficas no final desta apresentação). Depois desta caminhada toda é que Heidegger propriamente vai expor o que compreende e qual o alcance da questão central do seu ensaio ou seja, o originário enquanto verdade. Ele o explicita de um modo radical do § 180 a 186.
É no horizonte da verdade como desvelamento, em seu duplo negar, que Heidegger vai pensar O originário da obra de arte. O originário da verdade é a verdade do originário. Por isso a questão da verdade não é o núcleo fundamental apenas deste ensaio sobre a arte. Ela é a questão maior que atravessa e se faz presente como questão diretriz de toda a obra de Heidegger, porque a questão da verdade é a questão da realidade. Esta questão, além de ser tratada ao longo de todo o ensaio sobre a arte, é tematizada em outros livros e ensaios. Cabe ao leitor experienciar a questão, mergulhando nos textos de Heidegger. A retomada incessante da questão pelo próprio Heidegger já mostra a importância que essa questão tem em sua obra. E ela é, sem dúvida, também a questão para a arte, porque é a questão em que todo ser humano se debate. O conceito de arte como representação não tem a menor sustentação, nem artística, nem de pensamento, uma vez que não se pode pensar e ver a arte a partir de qualquer suporte: material ou teórico.
Não há como indicar uma ordem de leitura dos textos de Heidegger sobre verdade. Veja os seguintes títulos:
- Aletheia. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002;
- Von Wesen der Wahrheit. In: Wegmarken. Em português: Sobre a essência da verdade. In: Heidegger – Os pensadores. São Paulo, Abril Cultural, 1979, p. 127-145);
- Platons Lehre von der Wahrheit (Tradução francesa em: Questions II. Paris, Gallimard, 1968). In: Wegmarken, em alemão.
- De l’ essence de la vérité – approche de l’ “allegorie de la caverne” et du Théétète de Platon. Paris, Gallimard, 2001. Gesamtausgabe, Band 19. Frankfurt, Vittorio Klostermann, 1992.
- Vom Wesen der Wahrheit, Band 36/37 – Gesamtausgabe. Frankfurt, Vittorio Klostermann, 2001
- Parmenides. Band 54 - Gesamtausgabe. Frankfurt, Vittorio Klostermann, 2ª. ed. 1992. Trad. Espanhola de Carlos Másmela. Madrid, Ediciones Akal, 2005.
Pelo número de obras dedicadas à questão da verdade, o leitor pode ter uma pequena idéia do lugar fundamental dessa questão tanto para o pensamento como para a arte. Na realidade, para a vida, pois julgamos que é real o que é verdadeiro e que é verdadeiro o que é real. Notará também o leitor que ele estabelece um diálogo permanente com Platão. É importante que o leitor saiba que o Platão que emerge desse diálogo ainda é o Platão pensador e não aquele que o platonismo reduziu a um ismo doutrinal, cheio de conceitos, e do qual se ausentaram as questões.
Quando agora olhamos os diferentes títulos das partes do ensaio e vemos que há uma profunda interligação, não podemos deixar de chamar atenção para uma correlação final. O título da primeira parte diz: A coisa e a obra. culo se completa em torno da obra e da arte, tendo como refere manifestaçpaerguntao tçara os valores dos procedimentos teO título da terceira parte diz: A verdade e a arte. Justapostos ficam:
A coisa e a obra / A verdade e a arte.
Então perguntamos: qual a relação entre “coisa” e “arte”?, uma vez que uma dá início ao questionamento e a outra o encerra. Se pensarmos, como foi feito no percurso de todo o ensaio, circularmente, veremos que a questão da “coisa” recebe no ensaio dois encaminhamentos: o primeiro diz respeito aos conceitos metafísicos e à sua compreensão causal finalista. Olhando agora o título do ensaio: O originário da obra de arte, notamos que há um segundo encaminhamento, onde é a arte, a partir do originário, que nos abre o caminho para o que propriamente é “coisa”. O originário, a coisa e a arte remetem para o mesmo, mas não são a mesma coisa. Por isso ele pode afirmar no § 204: “... o que é a arte é uma daquelas perguntas a que no ensaio não é dada nenhuma resposta. O que parece ser resposta não passa de orientação para o questionamento”.
Esta afirmação do autor deve deixar bem claras três questões:
1ª. “§ 204. A arte não é tomada nem como um campo de realização cultural nem como uma manifestação do Espírito. Ela pertence ao acontecer-poético-apropriante [Ereignis], a partir do qual se determina o “sentido do ser” (compare Ser e Tempo)”.
Neste sentido, o ensaio se inscreve, como não poderia deixar de ser, na questão central da obra heideggeriana, que tem como mote a pergunta pelo esquecimento do sentido do ser, pela verdade do ser. É neste horizonte que se pensa o originário da obra de arte. Isto pressupõe que o leitor do ensaio, para que o compreenda, se lance nesse questionamento essencial que deve ser acompanhado pela leitura de outras obras e ensaios de Heidegger. Fazendo isso não estará apenas dialogando com as obras do autor, mas estará se abrindo para um diálogo com o pensamento metafísico ocidental. E esta, sem dúvida, é uma das maiores dificuldades para o leitor: ter um mínimo de conhecimento de todo este longo e complexo percurso filosófico, mas que por si não resolve, se for algo externo e conceitual. É decisivo que se abra para o que permanente e originariamente está sempre em questão, que se abra, enfim, para a história e estória do ser, da verdade do ser. Feito isso, poderá dialogar também com as obras de pensamento e com o pensamento poético de diferentes culturas e épocas.
2ª. Quando o autor caracteriza a obra de arte como “pôr-em-obra da verdade” fica implícita uma ambigüidade essencial. Quem é o sujeito de pôr? A verdade tanto pode ser o sujeito como o objeto, mas esta dualidade é imprópria. Na realidade e em verdade a arte é pensada a partir do acontecer-poético-apropriante originário. Este acontecer está para além da relação sujeito/objeto, porque o ser é apelo destinal aos homens, mas não sem estes. A essência do humano é o ser humano como lugar do acontecer poético-apropriante deste apelo destinal. No ser o lugar do acontecer deste apelo, é que o ser homem chega propriamente ao seu ser, isto é, ao humano. Neste sentido, toda obra de arte como lugar da verdade diz respeito ao lugar do humano como obra-de-arte, isto é, como o desvelar do humano.
3ª. Neste horizonte do desvelar do humano como obra-de-arte, coloca-se a questão permanente para todas as épocas e seres humanos: “... a referência do ser e da essência humana” § 206. Devemos entender aí como referência algo radical e enigmático. Eis o motivo pelo qual o autor logo a seguir diz aí mesmo que ela é “uma dificuldade aflitiva”. Por quê? Todo o esforço do pensador em pensar a referência do ser da obra de arte e do ser da arte encontra na referência da essência humana e do ser o seu horizonte de tentativa de compreensão.
De imediato, o que sempre se dá é o ente, é a obra de arte. Isto é tranqüilo e incontestável. Porém, não é meu pensar ou ver que põe o ente. Ele, originariamente, já se dá. Sem o dar-se eu não poderia nem vê-lo nem pensá-lo. De tudo que se dá a ver, vemos muito pouco e o pensamos ainda menos. De tudo que se dá a ver, é muito, mas muito mais o que não vemos e nem pensamos. Querer reduzir o que se dá a ver a qualquer perspectivismo ou jogo perspectivista subjetivo-epistemológico é jogar o jogo da avestruz. A vida num milímetro de terra é incomensuravelmente maior do que podemos detectar e ver. Para além do consciente há irrefutavelmente o inconsciente. Cada ente também não se põe a si mesmo. Ele é uma doação do ser, no sentido da verdade do ser. (Confira na bibliografia da Apresentação, de Heidegger: Tempo e ser).
É nesse dar-se que o ente chega à sua verdade e o ser homem chega ao que lhe é próprio: o humano, como a verdade do que é, como o que lhe é próprio. Mas o que antes de tudo é é o ser. Nessa referência acontecem duas questões essnciais: 1ª. O ser como originário dos entes, mas não como origem nem como essência universal abstrata. Isso fica muito evidente quanto constatamos que não é através de um conceito geral de arte que podemos chegar a conhecer “esta” ou “aquela” obra de arte no que ela é “esta” ou “aquela” obra de arte. O universal abstrato não dá conta da singularidade de cada obra, mas esta também só pode viger pelo vigor do originário.
Há uma referência necessária entre obra de arte e arte, assim como há uma referência necessária entre essência do humano e ser. Este “e” (o “entre”) não indica uma simples adição, mas o originário onde acontece a vigência da arte como o vigente da obra de arte. Por isso, esse “e/entre” originário foge à classificação alternativa de sujeito ou objeto, justamente por ser o originário concreto do universal e do singular;
2ª. É no âmbito do originário que Heidegger vai pensar a questão do criador/autor e do leitor/desvelador. O criador não é criador a partir de sua vontade ou imaginação, mas a partir do acontecer, nele, do originário como verdade. É o que Heidegger encaminha como Ereignis, o acontecer poético-apropriante.
Deixando acontecer nele a verdade, a obra é obra de arte, pois a arte é o pôr-se-em-obra da verdade. Esta é a grande tese do ensaio, mas numa nota posterior, de 1960, o autor sugere a substituição de “pôr em obra” por, porque diz melhor: “trazer-à-obra, pro-duzir, trazer enquanto deixar; poiesis”, § 196 (a).
Se o autor não é autor a partir de sua vontade e decisão, também o leitor não é o sujeito do ler. O leitor é leitor quando deixa o logos ser logos, no e como diá-logo. O acontecer do logos na leitura do leitor só acontece quando o leitor faz da leitura um desvelo (como o desvelo da mãe para com o filho). O desvelo traz em si a obediência à fala da verdade da obra de arte no acontecer poético-apropriante, no acontecer do logos. Desvelo é sempre um diálogo amoroso com a verdade da arte. O desvelo amoroso é um desvelamento no sentido grego de aletheia. E esta é o desvelamento da realidade como verdade. Temos, portanto, aí a referência de leitor e obra de arte como desvelo, porque acontece o desvelamento, a verdade.
À leitura como referência de leitor e obra de arte, Heidegger denominou: Bewahrung, guarda, conservação. É, em princípio, estranho que o autor, formado numa tradição hermenêutica, não tenha preferido esta palavra àquela. Naquela palavra ressoa o cuidar que conserva. O verbo bewahren significa conservar, não esquecer. O cuidar que conserva é o conservar do persistir e perdurar do que propriamente é a verdade, daí a ligação de Bewahrung com Wahrheit (verdade), que o pensador pensa como aletheia/desvelamento e Ereignis. O desvelo é um deixar perdurar o que acontece e permanece na constância do originário: “ ‘Wesen’, ‘viger’ é a mesma palavra que ‘währen’, ‘durar’, ‘permanecer’, ‘ficar’. Pensamos a vigência como a duração daquilo que, tendo chegado a desencobrir-se, assim perdura e permanece”. (Conferir na bibliografia no fim da apresentação Ensaios e conferências, p. 43). Wahrheit e Bewahrung têm o mesmo étimo do antigo alto-alemão: wara. Em Carta sobre o humanismo, p. 24, diz: “A linguagem é a casa do Ser. Em sua habitação mora o homem. Os pensadores e poetas lhe servem de vigias. Sua vigília [desvelo] é con-sumar a manifestação do Ser, porquanto, por seu dizer, a tornam linguagem e a conservam [aufbewahren] na linguagem” (conf. bibliografia). O conservar, em alemão, aufbewahren, na linguagem é o desvelo, o amor como vigor originário de união (logos). A vigília como desvelo também indica a presença cuidadosa e amorosa perante o que se vela e é misterioso. No “velório” não se vela simplesmente o morto, vela-se no morto o mistério da morte. E o interessante na palavra portuguesa des-velo, é que esse prefixo não indica negação, mas intensificação, no desvelo acontece o velar densificado pelo cuidado amoroso, pelo que está sendo velado e a partir do que se vela.
Também os leitores são solicitados à mesma vigília dos poetas e pensadores, porque os três precisam ser tomados pelo cuidado do que é digno de ser pensado: a verdade do sentido do ser, o mistério velado da verdade do ser. Toda vigília ou desvelo só é se for Ereignis, o acontecer poético-apropriante ou verdade. A constância do originário [wesen] como verdade é o amor originante. O desvelo é um deixar acontecer do saber como sabor do saber amoroso. É o que o pensador Platão denominou filos-sofia: o amor do saber.
Além disso, a palavra filosofia diz mais do que isso, de forma mais primigênia outra coisa. Filosofia é a junção de duas palavras, mas que significam um pouco mais do que amar o saber. Philos é originariamente, na língua grega, um pronome possessivo que dá conta do que pertence a alguém de maneira irreversível, tal como o nosso joelho nos pertence. Não diz então philos de qualquer espécie de posse transitória. Não se deve talvez nem falar, nesse caso, de posse, mas de pertença, daquilo que nos foi dado pela natureza e que ela mesma, só por si, não nos pode tirar. Philos é, de modo radical – um próprio. Um próprio tal como uma pronúncia não é separada do que pronuncia, senão na linguagem tornada mero meio, mero instrumento de comunicação. Assim, philos é o que é próprio e não pode deixar de sê-lo. (Jardim, 2004: 102).
A partir do pensamento de Antônio Jardim, podemos fazer a ligação entre: verdade, aletheia, desvelamento, desvelo/cuidado amoroso do originário, acontecer poético-apropriante, próprio como o que é vigente e permanece, Bewahrung. Em sua vigência e persistência, o originário é amor manifestante do que ele é em sua plenitude de sentido. Em termos gregos, o originário é a “arché” em seu “telos”. O desvelo do leitor não é um ato de sua vontade, é o acontecer poético-apropriante da arte como e em sua verdade. É nesse sentido que a obra de arte é o “pôr-se-em-obra da verdade” e o leitor desvelando se desvela como a mais fundamental obra de arte, porque no desvelo vela, cuida do que é digno de ser cuidado, pensado. Como desvelo, toda leitura é um narrar inaugural, onde a realidade se desvelando faz-se mundo, no dar-se e retrair-se do ser como época. Nas épocas temos a história da verdade do ser enquanto desvelamento e velamento, enquanto Mundo e Terra. E não e jamais como amorfa cronologia causal historiográfica. Esta, para poder falar do significado causal da historiografia, só o pode, embora num reducionismo causalista empobrecedor, a partir do sentido originário da verdade do ser como acontecer poético-apropriante, Ereignis. Por isso, Heidegger, nas sucessivas edições do presente ensaio, acrescentou em nota a diversos parágrafos, a palavra Ereignis. Este acréscimo é fundamental, pois a compreensão da arte como verdade do ser significa, por seu lado, a compreensão desta como acontecer poético-apropriante. Arte, originariamente, é sempre acontecer poético-apropriante como verdade do sentido do ser.
A permanência do humano para além das vicissitudes culturais e epocais é a permanência da referência do ser e da essência humana. À permanência como vigor da mudança e na sua mútua referência é que Heidegger convida a pensar como a verdade ou O originário da obra de arte.
Nunca se sabe que tipo de leitor dialogará com as questões que no ensaio estão propostas e levantadas. Por isso a indicação de leitura de outros ensaios e obras de Heidegger ajuda na caminhada dialogante. Para isso o leitor deve estar atento à dinâmica criativa do pensamento do pensador e tornar suas as questões do pensamento poético pensante.
Heidegger reitera que não propõe nenhuma solução para o enigma ou questão que é a arte. O que isso quer dizer? Diante da questão do originário em que se move o humano do homem como próprio da arte, a dinâmica de pensamento da presente obra-ensaio move-se no questionar e dialogar, e nunca numa concatenação de conceitos fechados, comprovando uma ou mais teses prévias.
Pelo questionar e dialogar, o autor estabelece uma rede de referências entre algumas palavras essenciais em que uma solicita a outra e esta a outras. Sem o leitor apreender esta dinâmica de referências, dificilmente irá compreender o operar da obra-ensaio na solicitação de um pensar que acompanhe, enquanto diálogo, o que é posto em questão. Quando o leitor conseguir, a partir do que lhe é próprio, fazer circular em diálogo o seu pensamento com o que é proposto como questão, então O originário da obra de arte começou a acontecer.
Para facilitar este percurso, oferecemos ao leitor três recursos:
1º. No final do ensaio algumas notas explicativas quanto a opções de tradução de alguns vocábulos essenciais, na constituição do todo da obra-ensaio. Certamente haveria outras possibilidades de tradução e até podemos ter cometido algumas falhas, naturalmente inevitáveis em toda tradução. Porém, o sentido vivo do todo da obra-ensaio foi decisivo. A tradução não se constitui numa amorfa transliteração. Moveu-nos o desvelo como o próprio pensador o propõe na referência de cada leitor com as grandes obras de arte e de pensamento. Julgamos que estamos diante de uma grande obra-ensaio de pensamento.
2º. Incluimos um índice remissivo. O importante é o próprio leitor fazer do remeter de um vocábulo para outro, dentro das passagens indicadas, uma dinâmica de reflexão e pensamento. Isto é essencial porque, moldados pelo e no pensamento metafísico, o deixar acontecer do pensamento originário exige do leitor uma paciente e difícil disciplina, pois o mais simples é também o mais doloroso: deixar eclodir no ordinário e habitual o extraordinário sempre inaugural. Difícil é, impossível não, sobretudo se houver a disposição de escuta do que já desde sempre como auto-diálogo nos move: o originário como o extraordinário de todo inaugurável a que a cada dia somos convocados pela voz íntima do que nos é próprio.
3º. No ensaio, a opção de vocabulário é cuidadosamente escolhida. Porém certas palavras encontram em outros ensaios ou obras, por parte do autor, uma reflexão bem mais ampla e aprofundada. O leitor que quiser, portanto, mover-se com maior profundidade e cuidado em relação às questões, pode e até deve procurar ler, dentro do possível, esses outros ensaios ou obras. Para isso damos a seguir algumas indicações. Todas, seria impossível e deixar de reconhecer nossos limites. Vale, cremos o intuito de abrir vias de percursos inaugurais para cada leitor.
O próprio autor no decorrer do texto já faz numerosas indicações. Nem todas elas já se encontram traduzidas para o português ou não são de nosso conhecimento. Não pretendemos indicar tudo, mas o que achamos essencial dentro de nosso horizonte de conhecimento.
No final desta apresentação não poderíamos deixar de agradecer a ajuda preciosa, em passagens de difícil tradução, da Profa. Dra. Maria José P. Monteiro, do Departamento de Letras Anglo-germânicas da Faculdade de Letras da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Bibliografia
Textos citados pelo autor no corpo do ensaio A origem da obra de arte.
1 – Hegel e os gregos. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
2 – Zur Sache des Denkens.
3 – O fim da filosofia e a tarefa do pensamento. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
4 – Sprache und Heimat.
5 – Aus der Erfahrung des Denkens.
6 – Identidade e diferença. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
7 – A coisa. Conferir a tradução portuguesa in: Ensaios e conferências. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Petrópolis, Vozes, 2002.
8 – Ser e tempo. Conferir a tradução portuguesa. Trad. Márcia de Sá Cavalvanti. Petrópolis, Vozes, 2004.
9 – Zur Seinsfrage.
10 – O autor cita ainda o fragmento 53 de Heráclito.
Algumas questões que aparecem no texto do ensaio são desenvolvidas mais profundamente em outros ensaios ou obras. Nesse sentido sugerimos a leitura, para aprofundamento de:
1 – Que é isto – a filosofia? Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S.Paulo, Abril Cultural, 1979.
2 – Que é metafísica? Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S. Paulo, Abril Cultural, 1979.
3 – Tempo e ser. Conferir a tradução portuguesa in: Os pensadores. Heidegger. Trad. Ernildo Stein. S.Paulo, Abril Cultural, 1979.
4 – Construir, habitar, pensar. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
5 – “... poeticamente o homem habita...”. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
6 – Logos (Heráclito, fragmento 50). In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
7 – Aletheia (Heráclito, fragmento 16). In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
8 – A questão da técnica. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
9 – Ciência e pensamento do sentido. In: Ensaios e conferências. Petrópolis, Vozes, 2002.
10 – Hölderlin e a essência da poesia. Há tradução francesa, in: Approche de Hölderlin. Paris, Gallimard, 1962. Há também tradução espanhola: Trad. Juan David García Bacca. Barcelona, Anthropos Editorial, 1989
11 – A caminho da linguagem. Trad. Márcia de Sá Cavalcante Schuback. Petrópolis, Vozes, 2003.
12 – Serenidade. Trad. Maria Madalena Andrade e Olga Santos. Lisboa, Instituto Piaget, s.d.
13 – Sobre o humanismo. Trad. Emmanuel Carneiro Leão. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro, 1967.
14 – Aportes a la filosofia – acerca del evento. Trad. Dina V. Picotti C. Buenos Aires, Editorial Almagesto e Editorial Biblos, 2003.
Outra bibliografia
JARDIM, Antônio. Quando a paixão é filosofia. In: CASTRO, Manuel Antônio de (org.). A construção poética do real. Rio de Janeiro, 7letras, 2004.
PAZ, Octavio. El arco y la lira. México, Fondo de Cultura Economica, 1973.
ROSA, João Guimarães. Primeiras estórias. Rio de Janeiro, José Olympio, 1967.
CASTRO, Manuel Antônio de. Heidegger e as questões da arte. In: A construção poética do real (org.). Rio de Janeiro, 7letras, 2004.
CASTRO, Manuel Antônio de. Interdisciplinaridade poética: o “entre”. In: Rio de Janeiro, Revista Tempo Brasileiro, 164, jan.-mar., 2006.
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