Prof. Manuel Antônio de Castrowww.travessiapoetica.com
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Pensar é deixar acontecer no ordinário o extraordinário,
é deixar presenciar-se no visível o invisível,
é deixar florescer no raciocínio o não-racional.
Há duas evidências inquestionáveis. O inquestionável diz o preceder das questões a todo questionar de quem questiona, pois o questionar é o deixar acontecer das questões. O limite do questionar não é o não poder questionar, mas o não poder questionar senão a partir das questões. Não somos nós que temos as questões. As questões é que nos têm. Somos nas e a partir delas. Já estamos jogados e abertos para as questões. E o questionar são possibilidades desse estar jogado no aberto que as próprias questões abrem. Por isso somos uma doação das questões. Nossas possibilidades de ser são as possibilidades dadas pelas próprias questões, para que, pelo questionar, nos apropriemos do que lhes sendo próprio, passe a ser o que nos é próprio, enquanto possibilidades que elas nos abrem e dão. Eis as evidências inquestionáveis:
1ª. Todo ser humano procede da physis;
2ª. Toda cultura procede da physis e do homem.
Estas duas evidências inquestionáveis nos colocam diante de três questões: Physis, homem, cultura. Como questões não somos nós que as podemos ter ou não, mas são elas que nos têm. Por outro lado, devemos dizer que, por serem questões, elas podem ser vistas e compreendidas de diferentes maneiras ou perspectivas (de onde se geram os diferentes paradigmas ou suportes teóricos). São os modos de compreender e responder às questões que variam, não as questões. Mas algo fica logo evidente também. Não é a cultura que faz o homem nem ela se opõe à physis. Se o homem, parece, está referenciado à cultura, em verdade, pela cultura o homem se referência à physis. Isso fica, de novo, evidente pelo fato de que diante do enigma e mistério da physis, o ser humano não só cultiva, mas, sobretudo e em primeiro lugar, ele cultua. O culto na e pela cultura já evidência que tudo provém da physis: o homem, o cultivado, a cultura e o culto. Nesta evidência não é a identidade cultural que faz o homem, mas o homem manifestando a physis, na cultura, manifesta-se como humano e, manifestando-se como humano, eleva a physis ao seu grau máximo de realização. Há, pois, um fazer da physis e um fazer do homem. A este fazer os gregos chamaram de poiesis, que deu nossa palavra poesia. Porém, se o ser humano ficasse só no fazer, ele não se distinguira da physis, no sentido em que esta, em geral, é tomada: o conjunto de todos as coisas, de todos os entes. O ser humano é, neste caso, um ente entre outros entes. O fazer humano é dimensionado, além da poiesis, em três instâncias que não comparecem no agir dos outros entes do modo como comparecem no ser humano. Mas essas três instâncias não são criações do ser humano. Pelo contrário, a physis, ao fazê-las presentes no ser humano é que torna propriamente o ser homem humano e elas lhe possibilitam fazer as diferentes culturas: o logos, o nous e a techné. Poiesis, logos, nous e techné são as possibilidades que a physis já tem em si e as faz presentes no ser homem para que ele atualizando-as, isto é, pondo-as em obra, faça todas as culturas e torne propriamente o ser homem humano. Àquelas obras onde se fazem presentes e vigentes a poiesis, o logos, o nous e a techné, é que chamamos obras de arte. Nestas, a physis se torna mundo e o ser homem se torna humano. No e pelo humano, o mistério da physis se torna humano e o este se torna o lugar da manifestação máxima da physis, ou seja, do enigma e mistério que é a physis, e que se nomeia de muitas maneiras, dependendo das culturas e dos cultos, das épocas e dos paradigmas. Nas obras de arte o que está em operação é essa manifestação máxima da physis e, ao mesmo tempo, a divinização do homem e a humanização do mistério. É isso a arte, é isso o humano.
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